by mends » 14 Mar 2005, 18:58
FOIE GRAS
Perto da meia-noite de 20 de agosto de 1988, quem sintonizava o SBT escutou os primeiros acordes de “New York, New York” e viu um sujeito baixo e de nariz polpudo sair de uma milionária mansão neoclássica, entrar em um Mercedes dourado e levantar vôo num helicóptero para aterrissar, com um microfone de ouro maciço na mão, no jardim do magnata Chiquinho Scarpa. Era a estréia do programa que mais exibiu e festejou a opulência dos milionários brasileiros – Ricos e Famosos com Atayde Patreze.
Até então, Atayde Gonçalves de Melo Patreze era um homem rico de 42 anos que desfrutava da fortuna herdada do pai. Como âncora televisivo, Atayde conseguiu alimentar sua assumida vaidade e a vontade do público de ver a vida de quem tem muito, muito mesmo. Depois de um ano no SBT, foi, a convite do próprio bispo Edir Macedo, para a Rede Record, onde estreou seu segundo e mais famoso programa, Atayde Patreze Visita.
Veio o sucesso, e, por sete anos, atingiu picos de até 10 pontos no Ibope. A mistura de extremos de sinceridade e puxa-saquismo, de ostentação e cafonice, de sofisticação e crueza, expunha tanto o conforto e a boa vida quanto o ridículo e o vazio dos donos da grana. Elevou seu slogan à uma máxima — “simplesmente um luxo”. Virou um cult. Viajava o mundo inteiro. Conhecia os melhores hotéis, os melhores restaurantes do planeta. Levava a vida que sempre sonhou. Foram os melhores sete anos de sua vida.
CHURRASCO GREGO
Há oito anos, ele sumiu. Muita gente acha que ele está fora do ar. Engano. Toda semana apresenta o programa Atayde Patreze: o Repórter, pela diminuta TV Comunitária. Se antes gravava em Bruxelas, hoje viaja para Araçariguama (SP). Se fazia entrevistas na piscina de sua mansão, hoje tem como cenário um escritório de advocacia no centro de São Paulo. Mas uma coisa ainda permanece de seus tempos áureos: seu microfone de ouro, igual ao de Frank Sinatra.
A derrocada de Patreze começou quando saiu da Record depois de brigar com Eduardo Laffond, o falecido diretor artístico da rede de TV do bispo. Mas o fundo do poço só veio há dois anos, quando seu único rim (ele havia doado o outro ao filho, 18 anos atrás) começou a falhar. Desesperado, foi à TV pedir ajuda. Deputados acharam que ele queria comprar um rim, e terminou tendo de dar explicações ao Congresso. Hoje, de dois em dois dias, faz hemodiálise. Acha que está com os dias contados, mas se anima quando fala nas pesquisas com células-tronco.
TUDO POR DINHEIRO
Atayde venera o dinheiro. Mesmo rico, aposta R$ 1mil na Mega-Sena toda vez que o prêmio supera os R$ 10 milhões. Despreza a pobreza. Não crê em caridade. Gosta de George W. Bush e acha que é impossível ser feliz sem um carro de luxo. Você pode chamar Patreze de tudo, menos de hipócrita. “Eu sempre tive bom dinheiro. Meu pai foi presidente da estrada de ferro Araraquara. Ele comprava muitas fazendas. Quando morreu, deixou US$ 10 milhões em dinheiro. Dividimos entre os três irmãos. Meu irmão Arlindo pegou a grana e começou a cheirar cocaína e morreu logo, com 38 anos. Não estava preparado para tanto dinheiro. Eu apliquei, comprei uma fazenda em Piraju, hoje estou bem.”
O ABACAXI DA FELICIDADE
“Há uns 18 anos, mais ou menos, eu estava morando em Nova York, no hotel Hilton, e fazia um curso de inglês na NYU. Um dia eu estava comendo um abacaxi na caixinha na 5ª avenida. E quem estava comendo outro do meu lado? O Silvio Santos. E aí batemos um papo e eu disse que trabalhava em Brasília com o ministro Ernani Galveias. O Silvio disse que tinha um problemão na Receita Federal. Não tinha cota suficiente para importar equipamentos. Levei o Sílvio para Brasília, apresentei ao ministro e houve a autorização, totalmente legal, para trazer esse equipamento. Graças a mim.
Aí o Sílvio falou: “Patreze, você tem voz boa, fala bem. Não quer fazer um programa na minha emissora? Que programa americano você gostaria de copiar?”. Respondi na hora, Rich and Famous. E eu tinha tudo o que precisava. Uma casa em Interlagos de US$ 1 milhão, uma cópia de uma casa da ilha de Mikonos na Grécia. Uma casa chique, refinada. Eu tinha um Mercedes vermelho, 450SL, conversível, dourado. E tinha um helicóptero. Fiz o primeiro Ricos e Famosos com Atayde Patreze assim: saía de minha casa de US$ 1 milhão, entrava no meu Mercedes, depois no helicóptero e desembarcava na casa do meu amigo Chiquinho Scarpa.
PATREZE DEU ANTES
“Fui pioneiro. A [revista] Caras quando começou era boa pra cacete, mostrava poder e riqueza. Mas hoje é uma péssima revista porque não mostra mais jatinhos, o helicóptero. Só mostra artistas de novelinha, artistinha vagabundo. Aquela ilha fajuta de Caras.
Olha, um salário de R$ 10 mil, R$ 15 mil dá para um classe média viver bem. Mas o que não dá é o povo ganhar essa miséria. Não dá pra ser feliz desse jeito. Quem diz que é feliz se engana. Não dá nem para comprar um carro. Um Fox, que é um carro de pobre, custa R$ 30 mil. Dá para viver, mas viver bem não dá. Não dá para ir ao Esplanada Grill, ao Fasano.”
SIMPLEMENTE UM LUXO
“Simplesmente um luxo são pessoas sérias. Pessoas que têm muito dinheiro são um luxo. Por exemplo, o Ronaldinho que casou agora com a Cicarelli. Ele era bregão, do mato, de favela, mas hoje é um luxo. Um cara que se casa em um castelo em Paris é um luxo. Chiquinho Scarpa, um luxo. Ivo Noal [bicheiro paulista] continua sendo um luxo. Roberto Marinho, que se foi, ainda é um luxo.
Uma pessoa pobre não pode ser um luxo. Ela não se destaca. Pobre só aparece em coluna policial. Por que você está me entrevistando? Porque eu não sou simplesmente um comum. Eu sou um Atayde Patreze que tem passado, que tem nome. Tenho o que falar. Eu me considero um luxo.”
"I used to be on an endless run.
Believe in miracles 'cause I'm one.
I have been blessed with the power to survive.
After all these years I'm still alive."
Joey Ramone, em uma das minhas músicas favoritas ("I Believe in Miracles")