by Aldo » 09 Aug 2005, 16:37
Filhinhos de papai, rebeldes sem causa potrestam contra o reitor da UNESP em Franca
Unesp registra BO contra manifestantes
Paulo Godoy
Free-lance para o Comércio
Diretores, professores, alunos e funcionários da Unesp de Franca decidiram repudiar a manifestação de um grupo formado por estudantes do curso de História, ocorrida anteontem de manhã, durante visita do reitor da universidade, Marcos Macari, ao câmpus local. Para protestar contra as condições do prédio da universidade, estudantes defecaram, vomitaram e depositaram urina sobre a mesa do reitor.
A manifestação extrapolou os limites da universidade, chegando à polícia. Ontem à tarde, o diretor do câmpus, professor Hélio Borghi, 69, tinha sobre sua mesa um boletim de ocorrência feito no primeiro distrito policial de Franca. Nele, estavam identificados os alunos Bruno Eduardo Legorin, 19, Petras Haruan Lago Antonelli, 20, Felipe Luís, 18, e Iamara de Almeida Nepomuceno, que poderão responder por crime contra a administração pública. A direção ainda quer identificar outros participantes do protesto.
A comissão formada logo após o incidente, com representantes de todos os setores do câmpus, deverá decidir qual o destino dos estudantes. A depender do estado de ânimo de alguns alunos, os colegas do primeiro ano de História deveriam ser expulsos.
Reunidos em uma sala do terceiro andar do complexo da Unesp em Franca, alunos do curso de Direito e Relações Internacionais dedicaram-se a traçar a estratégia que adotariam em relação aos manifestantes. "Não somos contra lutar por uma causa, defender aquilo em que se acredita", disse Enzo Coelho, 22 estudante de Relações Internacionais. "Não podemos concordar é com a forma que eles encontraram para chamar a atenção para os problemas do câmpus, rompendo com o respeito".
Da reunião, sairia uma carta aberta à comunidade, repudiando o ato dos colegas. A imagem que fica de um episódio como esse é a principal preocupação dos estudantes entrevistados pelo Comércio. "Já somos vistos com maus olhos por grande parte da população e, agora, ainda fazem isso", disse um deles que preferiu não se identificar. "Atitudes como essa enfraquecem o movimento estudantil".
MAIS INDIGNAÇÃO
A Asucaf, associação que representa os servidores da Unesp de Franca, é outro colegiado que se reuniu ontem para a mesma finalidade: discutir o ato ocorrido durante a manhã, no salão nobre do câmpus. A associação já tem pronta a sua carta em que repudia a atitude dos alunos, deixando a todos estarrecidos e envergonhados (leia a carta na página A-3).
O diretor do câmpus, professor Hélio Borghi, 69, ainda estava tentando entender os motivos que teriam levado os alunos a agir de forma tão insólita. "Eu tenho muitos anos de vida acadêmica e nunca havia visto uma barbaridade dessas", disse, lembrando de ter presenciado manifestações bem mais românticas ao longo de sua trajetória de aluno e docente.
O diretor recusou-se a antecipar o quais atitudes serão tomadas pela instituição. "Deixarei a responsabilidade para a comissão que foi formada". Hélio Borghi não soube dizer se, caso sejam expulsos, os alunos poderiam voltar a estudar na Unesp, mesmo que em outra unidade.
Preocupado com o que chamou de "arranhão" na imagem da instituição, o diretor prefere acreditar que as relações da comunidade com o câmpus de Franca e deste com universidade com a reitoria não serão abaladas. "Vou enviar um ofício ao reitor Marcos Macari, indicando as providências que tomamos, e com um pedido de desculpas formal pelo o que aconteceu", disse Borghi.
Ato se transforma em 'intervenção artística'
Eles se auto-denominam anarquistas, anarco-punks, ou coisa parecida. Se vestem de maneira alternativa e ouvem a banda espanhola Sín Dios, a brasileira Abuso Sonoro e a americana The Eternals. O toque de doçura fica por conta de Astor Piazolla e do jazzista Miles Davis. Como todo bom libertário, não têm ídolos, mas investem na reverência ao poeta inglês Willian Blake (1757-1827), que combinou em sua obra as linguagens literária e visual.
São inteligentes, estudaram em colégios particulares, falam inglês, dominam a informática, entendem a contracultura e falam com propriedade sobre o movimento Beatnick, que recusavam os valores estabelecidos pela sociedade americana em meados do século passado. Não é difícil notar as figuras de Bruno Legorin, 19, e Petras Haruan, 20, mesmo em meio a outros alunos.
O primeiro veste-se com roupas retrô, camisetas com mensagens políticas, óculos enormes e pesados. Petras é o inverso, mas igualmente chamativo. Prego na orelha, caneca presa à cintura, botas de motoqueiro, meia-calça de seda na cabeça e unhas pintadas uma de cada cor, são apenas parte de seu acervo de contrariedades.
Os dois, estudantes do primeiro ano de História, são parte do grupo que chocou a Unesp de Franca anteontem de manhã.
Para eles, o reitor Marcos Macari é uma "autoridade pífia", alguém que viria à cidade para falar o que os outros querem ouvir. "Sempre é a mesma coisa. Ele não atende às nossas reivindicações, não conversa com a gente", disse Bruno, que não tem nem um semestre de experiência universitária. "Não preciso esperar terminar meu curso para exigir melhorias", disse, referindo-se às condições estruturais do prédio.
Ao querer chamar a atenção do reitor para problemas no câmpus, eles exageraram na dose e, agora, podem pagar caro pela rebeldia. Para o que, ontem, classificaram de terrorismo poético, hoje chamaram intervenção artística. "Estamos sendo hostilizados porque nossa forma de protesto foi diferente da dos outros, mas ainda assim, é uma forma de protesto", disse Bruno.
Pais se espantam com postura dos filhos
O Comércio localizou os pais de Petras e Bruno Legorin na cidade de Campinas, onde moram. À mãe, Angelina, Bruno ligou logo cedo para contar o que aconteceu. Estava tão ou mais perplexa que o marido, Eduardo, ainda procurando entender a maneira inédita que o filho encontrou para protestar. "O Bruno sempre
teve preocupação com o lado social, nunca se vendo sozinho no mundo", disse o pai. Para a mãe, é muita informação que o filho vem recebendo e não sabe o que
fazer com ela.
Ao contrário do amigo, Petras, que sempre liga para os pais, ontem manteve-se longe do telefone. Ao ser informada pela reportagem da atitude do filho e da repercussão que o caso teve, Ana Helena Antonelli não quis acreditar no que ouvia. "Não é possível que o Petras que eu criei tenha feito isso", disse ela, preocupada com o que pode acontecer com o filho, dentro e fora da Unesp
A exemplo de Bruno, Petras Haruan estudou em um dos melhores colégios particulares de Campinas. Tido como educado, gentil e atencioso por colegas e professores, seria, na opinião da mãe, incapaz de ofender a quem quer que fosse. O pai segue na mesma direção. Wilson Antonelli disse que o filho odeia violência, não usa drogas, não bebe álcool e não gosta de sair à noite. "A forma como se veste é uma casca, uma maneira de se expressar", disse o pai. "Por trás daquela aparência, há uma pessoa excepcional.
Os pais dos dois alunos pretendem vir a Franca ainda nesta semana para tentar um encontro com a direção da Unesp na cidade.
Para Chiachiri, manifestações devem ser apenas por palavras
O historiador, criador e diretor por oito anos do arquivo municipal e membro da Academia Francana de Letras, José Chiachiri Filho, reagiu com bom humor à manifestação dos universitários da Unesp, na manhã da última terça-feira. "Podia ser uma manifestação menos mal cheirosa", disse, brincando.
Apesar de ironizar a situação, Chiachiri não concorda com esse tipo de protesto. "Toda pessoa tem o direito de se manifestar, mas desde que seja por
palavras ou pela escrita", disse.
Para ele, o ato dos estudantes do curso de História da Unesp foi impensado. "Uma pessoa em seu estado normal pensaria melhor antes de fazer as necessidades fisiológicas na frente de outras pessoas", argumentou o historiador.
Chiachiri disse que não é bom para a imagem da universidade e para o curso de História comportamentos como esse. Disse nunca ter ouvido falar em protesto semelhante. "A atitude de poucos estudantes acaba sujando o trabalho de uma instituição séria e com pessoas interessadas", ressaltou. "Penso que eles poderiam ter usado o banheiro primeiro e depois, munidos de argumentos, com críticas e sugestões, fazer seus protestos", afirma Chiachiri. "Não há manifestação melhor e mais forte do que palavras bem ditas".
A atitude dos estudantes acabam com o próprio sentido do protesto. "Eles defecaram na própria manifestação".
'Estudantes não sofrem com doenças mentais', diz psicólogo
O protesto grotesco (defecar, urinar e vomitar em frente ao reitor) feito por um grupo de estudantes da Unesp (Universidade Estadual Paulista) foi entendido pelos psicólogos como um ato inconseqüente, o qual não pode ser tratado como doença.
Para o profissional Flávio Indiano de Oliveira, essa não é uma forma de conduta aceitável. Para ele, o único objetivo dos estudantes rebeldes era encontrar uma maneira de chamar a atenção da mídia. "Presentear o reitor com as necessidades fisiológicas atrai mais do que qualquer outro tipo de manifesto", disse.
Flávio destacou que os jovens sabiam que suas atitudes iriam chocar quem presenciasse o ato. "Isso choca, desperta a atenção. Fere mais do que colocar nariz de palhaço, mostrar as nádegas e incendiar pneus", contou.
O grupo disse que o protesto - que primeiro foi nomeado de terrorismo poético e depois se transformou em uma intervenção artística - foi planejado por dois meses, e por essa razão, a psicologia entende a manifestação como uma "quebra" das normas de conduta. "O ato está fora dos nossos padrões, mas eles não
podem ser vistos como desequilibrados e doentes. Apenas adeptos de uma contracultura", disse Flávio.
Segundo o psicólogo, existem outras formas de manifestação para se conseguir atingir objetivos, e "este tipo de jovem acaba sempre preferindo o mais forte para atrair a imprensa". A ação só é tida como doença, como esquizofrenia ou desequilíbrio quando não tem intenção de ferir.
MANIFESTO - FÓRUM DE DIRETORES DAS UNIDADES DA UNESP.
UNESP - UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
"Júlio de Mesquita Filho"
FÓRUM DE DIRETORES
MANIFESTO
Os Diretores das Unidades Universitárias da UNESP, reunidos em 4 de agosto de 2005, no Instituto de Química de Araraquara, considerando os atos abomináveis praticados por quatro estudantes durante reunião entre professores, alunos e funcionários, no Campus de Franca, realizada em 2 de agosto de 2005 e na presença do Magnífico Reitor da Universidade, Prof. Dr. Marcos Macari, decidiram por unanimidade manifestar:
1. Irrestrita solidariedade à comunidade universitária de Franca, ao seu Diretor, Prof. Dr. Hélio Borghi e ao Magnífico Reitor da UNESP, Prof. Dr. Marcos Macari em razão da ofensa hedionda de que foram vítimas;
2. Veemente repúdio às ações que representam agressão à Universidade, bem como atentado aos princípios de civilidade;
3. Apoio à adoção imediata de medidas legais com a finalidade de responsabilizar todos os envolvidos.
Prof. Dr. Paulo Roberto Botacin, Prof. Dr. Iguatemy Lourenço Brunetti,
Prof. Dr. Cláudio B. Gomide de Souza, Profa. Dra. Rosemary Adriana
C.Marcantonio
Profa. Dra. Maysa Furlan, Prof. Dr. Antonio Celso Ferreira,Prof. Dr.
Antonio
Carlos de Jesus, Prof. Dr. José Brás Barreto de Oliveira, Prof. Dr.
Lauro
Henrique M. Chueiri, Prof. Dr. Leonardo Teodoro Büll, Prof. Dr. Joel
Spadaro
Prof. Dr. Edson Ramos de Siqueira, Profa. Dra. Maria de Lourdes M.V.
Paulino
Prof. Dr. Hélio Borghi, Profa. Dra. Tânia Cristina A. Macedo de Azevedo
Prof. Dr. Wilson Manzoli Júnior, Prof. Dr. Roberval Daiton Vieira
Prof. Dr. Tullo Vigevani, Prof. Dr. Neri Alves, Prof. Dr. Amilton
Ferreira
Prof. Dr. Sebastião Gomes de Carvalho, Prof. Dr. Paulo Villela Santos
Junior
Prof. Dr. Johnny Rizzieri Olivieri, Prof. Dr. João Cardoso Palma Filho
Prof. Dr. Marcelo Amaro Pinheiro, Prof. Dr. Henrique Luiz Monteiro.