by Danilo » 02 Jan 2009, 20:50
O trecho de texto abaixo é de um físico famoso cujo nome só revelo no final. Não, não é o Jr. Alguns comentários meus em azul.
Por que o socialismo?
... O indivíduo tornou-se mais consciente que nunca de sua dependência para com a sociedade. Não vive essa dependência, contudo, como uma vantagem, um vínculo orgânico, uma força protetora, mas antes como uma ameaça a seus direitos naturais, ou até a sua existência econômica. Além disso, sua posição na sociedade é tal que as tendências egoístas de sua constituição vão sendo constantemente acentuadas, ao passo que suas tendências sociais, por natureza mais fracas, deterioram progressivamente. Todos os seres humanos, seja qual for a posição que ocupem na sociedade, estão sofrendo esse processo de deterioração. (...)
A anarquia econômica da sociedade capitalista tal como ela existe hoje é, na minha opinião, a verdadeira fonte do mal. Vemos diante de nós uma imensa comunidade de produtores cujos membros lutam incessantemente para despojar uns aos outros dos frutos de seu trabalho coletivo — não pela força e sim, em geral, pelo fiel cumprimento das normas legalmente estabelicidadas. Sob este aspecto, é importante perceber que os meios de produção podem legalmente ser, e em sua maior parte são, propriedade privada de indivíduos.
Para simplificar, na discussão que se segue chamarei “trabalhadores” os que participam na propriedade dos meios de produção, apesar de isto não corresponder ao uso corrente do termo. Usando os meios de produção, o trabalhador produz novos bens que transformam-se em propriedade do capitalista. O ponto essencial nesse processo é a relação entre o que o trabalhador produz e o que lhe é pago, ambos medidos em termos de valor real.
— O que ou quem definiria “valor real”? — Em quanto o contrato do trabalho é “livre”, o que o trabalhador recebe está determinado não pelo valor real dos bens que produz mas por suas necessidades mínimas e pela relação entre a demanda de força de trabalho pelos capitalistas e o número de número de trabalhadores que competem por empregos. É importante compreender que, mesmo na teoria, o pagamento dos trabalhadores não é determinado pelo valor do que eles produzem.
O capital privado tende a se concentrar em poucas mãos, em parte devido à competição entre os capitalistas, e em parte porque o desenvolvimento tecnológico e a crescente divisão do trabalho alentam a formação de unidades maiores de produção em detrimento das menores. O resultado destes desenvolvimentos é uma oligarquia do capital privado cujo enorme poder não pode ser controlado efetivamente nem sequer por uma sociedade política democraticamente organizada. Isto é assim porque os membros dos corpos legislativos são selecionados pelos partidos políticos, em grande medida financiados ou de alguma maneira influenciados por capitalistas privados que, por todos efeitos práticos, separam o eleitorado da legislatura. A consequência é que os representantes do povo não protegem suficientemente os interesses dos grupos não privilegiados da população. Por outra parte, nas condições atuais os capitalistas privados controlam, direta ou indiretamente, as principais fontes de informação (imprensa escrita, rádio, educação). Nas áreas de humanas da educação pública superior esse controle capitalista do pensamento inexiste. É então extremamente difícil, e por certo impossível na maioria dos casos, que cada cidadão possa chegar às conclusões objetivas e fazer uso inteligente de seus direitos políticos.
A situação prevalecente em uma sociedade baseada na propriedade privada do capital está então caracterizada por dois princípios mestres: primeiro, os meios de produção são propriedade de indivíduos, e estes dispõem deles como melhor lhes parecer; segundo, o contrato de trabalho é livre. Supostamente, não existe sociedade capitalista pura, neste sentido. Em particular, deve-se assinalar que os trabalhadores, por meio de grandes e amargas lutas políticas, tem conseguido uma forma um tanto melhorada do “livre contrato de trabalho” para certas categorias de trabalhadores. Mas, tomada como um todo, a economia atual não difere muito do capitalismo “puro”.
A produção é orientada para o lucro, não para o uso. Nada assegura que todos os que podem e querem trabalhar terão sempre condições de encontrar emprego; um “exército de desempregados” existe quase sempre. Uma vez que os trabalhadores desempregados e mal remunerados não geram um mercado lucrativo, a produção de bens de consumo é restringida, o que redunda em grande penúria. Frequentemente, o progresso tecnológico, em vez de aliviar a carga de trabalho para todos, resulta em maior desemprego. O objetivo de lucro, conjugado com a concorrência entre os capitalistas, é responsável por uma instabilidade no acúmulo e na utilização do capital que leva a recessões cada vez mais graves. — hein? irregular distribuição causada pela livre concorrência!? — A concorrência irrestrita conduz a um imenso desperdício de mão-de-obra e ao embotamento da consciência social dos indivíduos.
Esse embotamento dos indivíduos é, a meu ver, o pior mal do capitalismo. Todo o sistema educacional padece desse mal. Uma atitude exageradamente competitiva é incucada no aluno, que é preparado para sua futura carreira aprendendo a cultuar o sucesso material.
Estou convencido de que há somente uma forma de eliminar estes graves malefícios: através do estabelecimento de uma economia socialista, acompanhada por um sistema educacional que seja orientado para fins sociais. Em tal economia, os meios de produção são propriedade da própria sociedade e utilizados de maneira planejada. Uma economia planejada, que ajuste a produção às necessidades da comunidade, distribuiria o trabalho entre todos aptos a trabalhar e garantiria os meios de vida de todos, homem, mulher e criança. A educação do indivíduo, além de promover suas próprias habilidades inatas, intentaria desenvolver em um sentido de responsabilidade por seu próximo, em lugar da glorificação do poder e do êxito em nossa sociedade atual.
É preciso lembrar, entretanto, que uma economia planificada não é todavia o socialismo. Uma economia planificada como tal pode ser acompanhada pela completa escravização do indivíduo.
A conquista do socialismo exige a solução de alguns problemas sociopolíticos extremamente difíceis: como é possível, em face da ampla centralização do poder político e econômico, evitar que a burocracia se torne todo-poderosa e arrogante? O melhor jeito de proteger, do meu humilde ponto de vista, é nunca centralizando qualquer tipo de poder. Como proteger os direitos do indivíduo, e com isso, assegurar um contrapeso democrático ao poder da burocracia?
Original intitulado “Why Socialism?” escrito por Albert Einstein em 1949.