...precisava do governo falar alguma coisa pra se dar conta que coisas motorizadas menores seriam interessantes pra se ter nas ruas entupidas mundo afora?
Uma resposta é a matéria de capa de Exame desse mês. Além de falar de quanto os custos trabalhistas, mesmo nos EUA, atrapalha todo um setor. Aliás, pensando bem, a matéria ajuda a responder uma dúvida que deixei faz muitos meses: a crise pode afetar o mercado do design (em viewtopic.php?p=12305#p12305)? Segue trecho da matéria:Desde 1908, quando Henry Ford criou a linha de produção, lançando a pedra fundamental do império automobilístico americano, nunca a supremacia do país nessa área havia sido tão ameaçada... As cartas não vão ser marcadas como no passado, quando os alemães dominavam o mercado de sedãs, os italianos eram insuperáveis na produção de esportivos e os americanos não tinham rivais à altura no segmento de utilitários. Segundo uma pesquisa da consultoria KPMG com 200 altos executivos da indústria, os modelos que farão sucesso nos próximos anos serão veículos compactos, com motores menores e mais eficientes, capazes de caber no bolso da maior parte dos consumidores e, ao mesmo tempo, pacificar os ambientalistas.
Se fizeram a revolução do carro no início do século 20, as montadoras de Detroit largam agora em desvantagem na disputa nesse novo terreno, pois têm diante de si adversários que já nasceram de olho nos desafios do século 21. Antes de iniciar seu ataque, os japoneses da Toyota estudaram todas as fraquezas das montadoras americanas. Isso ajudou a criar, na década de 70, um sistema de produção econômico, eficiente e enxuto, que acabou por mudar os padrões da indústria. Seus modelos ganharam mercado nos Estados Unidos graças à qualidade e aos preços menores (nesse aspecto, o fato de não ter a carga de acordos trabalhistas de suas concorrentes americanas foi determinante). A Toyota também inovou e se renovou ao investir na tecnologia dos híbridos, com o lançamento do Prius, em 1996. Quando chegou ao mercado, o Prius foi desprezado pelos concorrentes de Detroit, que corriam na direção oposta, empanturrando-se com os lucros das vendas de utilitários beberrões. Hoje, o Prius, com mais de 1 milhão de unidades vendidas no mundo, tem a cara do futuro da indústria.
Depois da Toyota, um dos maiores casos de sucesso de uma montadora estrangeira nos Estados Unidos é o da coreana Hyundai. Até os anos 80, sua tentativa de ganhar o mercado americano era motivo de piada, tamanha a ruindade e a feiura de seus carros. Aos poucos, porém, conseguiram virar o jogo e se transformar num modelo de eficiência para o século 21. "Os coreanos fizeram o que os americanos realizaram na década de 50 e os japoneses na década de 70: investiram em qualidade e tecnologia", diz o consultor André Beer, ex-vice-presidente da GM no Brasil. Desde o final da década de 90, a Hyundai é a marca que mais cresce nos Estados Unidos. No ano passado o Genesis, seu sedã de luxo, ganhou todos os principais prêmios do mercado americano. Recentemente, a Hyundai também virou modelo para os outros fabricantes em iniciativas de marketing, como no caso da promoção que oferece um "seguro-desemprego" de três meses aos compradores de seus carros. Caso as dificuldades do cliente ultrapassem esse período, a montadora devolve o dinheiro pago e fica com o carro. Funcionou. Nos três primeiros meses deste ano, a Hyundai cresceu 4,5% no mercado americano, com 70 000 unidades vendidas. No mesmo período, a GM teve queda de 50%.
O conjunto de erros que levaram Detroit à beira do precipício parece elementar demais quando visto aos olhos de hoje, mas as medidas que poderiam evitá-los não eram tão simples e óbvias nos momentos em que deveriam ser tomadas. Os custos trabalhistas que as montadoras carregam hoje são absurdos. Mas seria a melhor tática bater de frente no passado com o United Auto Workers, o poderoso sindicato de Detroit, que chegou a paralisar as fábricas da GM na cidade por 67 dias em 1970, durante uma histórica discussão trabalhista? Tempos depois, no auge da era da obesidade veicular, quem teria coragem de iniciar a desativação de linhas de produtos que vendiam por ano cerca de 6 milhões de unidades? "As grandes montadoras americanas pagaram o preço de terem sido as primeiras a enfrentar problemas como as pressões sindicais", afirma o consultor George Magliano, diretor da área automotiva da IHS Global Insight.
Apesar da situação periclitante em Detroit e dos enormes desafios diante da nova concorrência, ninguém ainda pode decretar a morte das Big Three. Caso realmente concretize a união com a Fiat, a Chrysler pode ter acesso ao mercado europeu e se beneficiar dos carros compactos do portfólio de produtos da montadora italiana. A Ford deve adotar estratégia semelhante nos próximos anos, investindo em modelos compactos, como o relançamento do Fiesta para o mercado americano, previsto para ocorrer em 2010. O certo é que, no futuro próximo, Chrysler e Ford serão empresas diferentes - talvez menores.
Destino semelhante deve ter a GM, símbolo do sonho americano. É possível que, num processo de recuperação judicial, a empresa seja dividida em duas partes. A banda podre teria suas dívidas com credores e fornecedores suspensas, enquanto a "GM boa" ficaria com as marcas Chevrolet e Cadillac, mas sem os encargos pesados que esses negócios carregam hoje, ajudando a formar o núcleo de uma nova e mais eficiente companhia. "As Big Three vão continuar ocupando um espaço relevante, mas não vejo como alguma delas possa voltar à liderança mundial", disse a EXAME um dos mais respeitados colunistas da indústria automotiva americana, Dan Neil, do jornal Los Angeles Times. Em outros termos: Detroit terá um lugar garantido na nova ordem da indústria automobilística. Mas não será mais a única força - nem a mais importante.
(matéria completa em http://portalexame.abril.uol.com.br/rev ... 49763.html)