RUMO À DITADURA

América Latina, Brasil, governo e desgoverno
CPIs mil, eleições, fatos engraçados e outros nem tanto...

RUMO À DITADURA

Postby mends » 15 Mar 2007, 18:56

Como as coisas estão ficando cada dia mais graves, tópico novo...

Rumo à ditadura
Leriam o que está no Estadão desta quinta. Volto em seguida:
“Depois de tentar dar aos fiscais da Receita o poder de multar empresas que considerar infratoras da legislação trabalhista, sem prévio julgamento da Justiça do Trabalho, o governo quer bloquear bens de devedores da Receita e da Previdência, também sem autorização do Poder Judiciário, e executar a penhora de forma sumária. O governo considera que o atual processo de cobrança, passando pela Justiça, é lento demais, e vai encaminhar projeto de lei ao Congresso no começo de abril. De acordo com o procurador-geral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Adams, é preciso aumentar a agilidade da cobrança de tributos não pagos no prazo determinado por lei. A penhora sem autorização da Justiça, de acordo com ele, só não valeria para dois casos. 'A indisponibilidade geral de bens do devedor e o bloqueio do faturamento das empresas com dívidas em execução judicial deverão ter autorização prévia da Justiça.' A mudança, segundo Adams, foi inspirada no modelo do Banco Central para os casos de intervenção em instituições financeiras. Por esse motivo, ele não acredita que a proposta, apresentada ontem pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ellen Gracie, seja inconstitucional.” (íntegra aqui para assinantes).

Voltei
Entenderam o raciocínio perturbado? Como a Justiça é muito lenta, em vez de reformá-la, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva propõe simplesmente atropelá-la. É claro que uma ditadura política, ainda que mitigada e macaqueando mecanismos da democracia, não se instala sem instrumentos que permitam uma ditadura também econômica.
A proposta que vai acima é um arreganho autoritário. Significa pôr toda a iniciativa privada debaixo da espada. Caberia ao Poder Executivo, quando lhe desse na telha, executar uma dívida. Sim, claro, há sonegadores de má fé. Muitos. Mas também há aqueles que recorrem das decisões oficiais sobre impostos. É isso aí: quando achamos que o PT chegou ao limite, o partido avança um pouquinho mais.
A passar essa proposta, milhões de empresas se tornam objeto de chantagem do governo. Sim, sim, e-mails para os ministros do STF. Ou enchemos bastante o saco desses caras, ou o PT ainda vai nos dizer o que devemos comer no jantar.

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Postby mends » 15 Mar 2007, 19:02

Ainda a Emenda Três: o cerco petralha
Os blogs “deles” devem andar chatos pra caramba, porque agora deram pra vir torrar a paciência aqui no meu. Vá lá. Tem sua utilidade. A gente sabe ao menos o que anda pensando o Jurassic Park. Como NÃO DIRIA Bento 16, essa gente é uma VERDADEIRA PRAGA. Os mais encantadores não são aqueles simples de alma, petralhas porque esmagados pela ignorância, mas os militantes mesmo, aqueles que exercem o ódio sistemático à liberdade e ao individualismo como princípio. Anseiam ter não apenas uma visão de mundo como se supõem também inteligentes e espirituosos. Alguns leitores me cobram: “Por que você responde?”. Para que a resposta circule na rede, e esses imbecis não falem sozinhos. É da natureza deste meio. Sobre a Emenda 3 (ver abaixo) recebo algumas provocações. Elas seguem em vermelho, e a minha resposta, em azul:

Escreve um deles:
A emenda 3 é pura excrescência. Poderia ser chamad... A emenda 3 é pura excrescência. Poderia ser chamada de emenda 171. Conheço muita gente que foi obrigada a pedir demissão para abrir uma empresa e ser recontratada por ela para fazer a mesma coisa. E, logicamente, sem ter direito a 13º, férias, previdência, licenças, jornada de trabalho, hora extra e demais proteções sociais, que os "reformadores" chamam de "Custo Brasil". Aliás, é incrível que os liberais do PFL chamem de modernidade retroceder às relações de trabalho do século XVIII, quando os trabalhadores morriam nas linhas de produção ralando em condições insalubres de 14 a 16 horas por dia, sem direito a qualquer benefício. Mas é claro que os latifundiários, banqueiros, industriais e demais "pobres coitados" adorariam que isso ocorresse novamente.
Ufa! Essa gente não consegue escrever três linhas sem massacrar alguns “trabaidô” para ver se a falta de argumento é compensada pelo exemplo dramático. Os contratos de Pessoa Jurídica, que são o verdadeiro alvo do governo, regulam atividades que estão muito distantes das condições insalubres de trabalho que excitam a imaginação do missivista. Esse pastiche da descrição marxista da revolução industrial inglesa já não existe mais nem no chão da fábrica.
A lembrança dos “latifundiários, banqueiros, industriais e demais pobres coitados” ilustra bem a mente perturbada dessa gente. Caso a Emenda Três seja vetada, em que esses aliados do PT seriam prejudicados? Em nada! Digamos que exista, sei lá, um especialista em informática que preste serviço a um banco como pessoa jurídica. O que “eles” querem é que um fiscal do trabalho, sem nem mesmo o auxílio da Justiça, tenha o poder de decretar que a sua relação contratual com o banco é inválida. O esbirro do Estado totalitário poderia até mesmo desconstituir a empresa do sujeito — é claro que ele não vai poder desconstituir o banco, certo? Além de tudo, trata-se de uma covardia.
O que vocês acham que a empresa que contratou o serviço fará se um fiscal, investido do papel de juiz, decidir que aquela relação é inválida? Registrar em carteira o prestador de serviço? Pode até acontecer num caso ou noutro. Na maioria das vezes, vai-se dar o óbvio: a relação, regulada por um contrato, passará a ser informal. Pronto. Se a existência de um acordo legal atrai um fiscal para taxar ou extorquir as partes, então é melhor não haver vínculo legal nenhum.
Esse debate é coisa de gente vigarista. Mais da metade da mão-de-obra no Brasil está na informalidade, SEM CONTRATO NENHUM! Isso, sim, deveria ser objeto de preocupação do governo.

Aí escreve outro:
Hum... Vejo um certo interesse “pessoal” do jornal... Hum... Vejo um certo interesse “pessoal” do jornalista na questão. Vamos aos fatos:Costuma dizer que a carga tributária no Brasil é elevada. Pois está certo, é quase um confisco. Costuma dizer que a sonegação não é o caminho para se diminuir a carga tributária. Pois está absolutamente correto (salve o Estado de Direito!). Diz que é preciso diminuir a carga LEGALMENTE. Novamente corretíssimo. Se não me engano, acha a que a legislação trabalhista interfere muito no que as partes (contratante e contratado) desejam celebrar entre si. Mais uma vez concordo.Entretanto, nesse caso, defende um raciocínio contrário ao que está acima descrito, uma vez que a emenda 3 NÃO ALTERA A RELAÇÃO ENTRE AS PARTES; também não cria poderes para a fiscalização. Simplesmente retira o poder de fiscalizar esse tipo de situação. Se a emenda 3 aumentasse a carga tributária, faria todo sentido a campanha patrocinada pelo jornalista, patrioticamente pedindo que seus leitores mandem e-mails para os senadores. Mas por que impedir a fiscalização? Ah, porque o fiscal age como um juiz! Ótimo, então vamos tirar todos os policiais da rua. Afinal, eles agem como juiz quando prendem um bandido em um assalto que presenciaram. O sujeito nem foi condenado em última instância e já está lá, coitado, algemado pelo policial-juiz.Caro, não se esqueça de que as empresas autuadas pela fiscalização podem recorrer administrativamente e JUDICIALMENTE.Em tempo, é conversa mole, sim, a história de que dificulta a fiscalização do trabalho escravo ou infantil. E é esse o gancho que o jornalista se apega para justificar seu estranho pleito.
É formidável! Trata-se de um tipo particular de dislexia argumentativa. Os argumentos vão na contramão da tese. Vamos ver. Sem contar a ignorância ou má fé específicas. A Emenda 3 impede um fiscal de decidir se uma determinada relação CONTRATUAL é ou não lícita sem o auxilio da Justiça. REITERO: QUEREM TRANSFORMAR FISCAL EM JUIZ. A fiscalização continua a existir do mesmo jeito. O exemplo do policial é idiota. Ele pode prender, mas não pode condenar, tarefa que continua com a Justiça. No exemplo dado pelo leitor, o guarda, além do “Teje preso”, ainda decidiria: “E vai ficar tantos anos na cadeia”.
Quanto à questão da carga tributária, é desinformação: os Ministérios da Fazenda e do Trabalho estão apenas fazendo uma jogadinha política. Querem que Lula vete a Emenda Três para criar uma regulamentação posterior. Que tipo de regulamentação? Aumentando mais os impostos da Pessoa Jurídica para desestimular esse tipo de contrato. Isso já está dito.
Vale dizer: com mais da metade dos trabalhadores pobres na informalidade em razão dos custos absurdos de contratação da mão-de-obra no Brasil, em vez de o governo estimular a formalidade, faz justamente o contrário: age para que ela aumente, que é o que vai acontecer se Lula vetar a tal emenda e os senadores não derrubarem o veto.
Quanto à questão do trabalho escravo e infantil, vejam só: o próprio leitor, favorável ao veto, confessa: é pura conversa mole. Esse foi o mote inicial da luta “deles”. Como não colou, tenta-se outro caminho. Ah, sim, há outros comentários lá contrários à tese que defendo aqui, mas não merecem resposta por muito parvos.

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Postby mends » 22 Mar 2007, 18:00

A Emenda 3 e o projeto da Lei Habilitante do PT
O governo Lula está a um passo de testar um novo modelo legislativo. De certo modo, o Executivo está pedindo ao Congresso que aprove o primeiro passo de uma espécie de Lei Habilitante. Lembram-se da tal Emenda 3, aprovada no bojo da Super-Receita? Ela proibia fiscal de se comportar como juiz e desconstituir olimpicamente uma empresa. Lula vetou. Nota: o fiscal não ficava proibido de notificar a empresa em questão. Mas a decisão final caberia à Justiça. Os senadores se organizam para tentar derrubar o veto.

O governo, demonstrando o que entende ser a sua “disposição para negociar”, ficou de propor um projeto de lei para disciplinar a questão. E propôs. É o elogio ao autoritarismo. Vejam o que diz o decreto. Depois retomo:

Estabelece procedimentos para desconsideração de atos ou negócios jurídicos, para fins tributários, conforme previsto no parágrafo único do art. 116 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional (CTN), introduzido pela Lei Complementar no 104, de 10 de janeiro de 2001, e dá outras providências.
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
Art. 1º Os atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência de fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária serão desconsiderados, para fins tributários, pela autoridade administrativa competente, observados os procedimentos estabelecidos nesta Lei.
1º São passíveis de desconsideração os atos ou negócios jurídicos que visem ocultar os reais elementos do fato gerador, de forma a reduzir o valor de tributo, evitar ou postergar o seu pagamento.
2º O disposto neste artigo não se aplica nas hipóteses de que trata o inciso VII do art. 149 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional (CTN).
Art. 2º Na hipótese de atos ou negócios jurídicos passíveis de desconsideração, nos termos do ? 1º do art. 1º, o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil expedirá notificação fiscal ao sujeito passivo, na qual relatará os fatos e fundamentos que justifiquem a desconsideração.
1o O sujeito passivo poderá apresentar, no prazo de trinta dias, os esclarecimentos e provas que julgar necessários.
2º Considerados improcedentes os esclarecimentos apresentados, o Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil formalizará representação à autoridade administrativa que instaurou o procedimento de fiscalização.
3º A representação de que trata este artigo deverá:
I - conter relatório circunstanciado dos atos ou negócios praticados e a descrição dos atos ou negócios equivalentes aos praticados, bem assim os fundamentos que justifiquem a desconsideração.
II - discriminar os elementos ou fatos caracterizadores de que os atos ou negócios jurídicos foram praticados com a finalidade de ocultar os reais elementos constitutivos do fato gerador;
III - ser instruída com os elementos de prova colhidos no curso do procedimento de fiscalização e os esclarecimentos e provas apresentados pelo sujeito passivo; e
IV - conter o resultado tributário produzido pela adoção dos atos ou negócios praticados em relação aos equivalentes, referidos no inciso I, com especificação da base de cálculo, da alíquota incidente e do montante do tributo apurado.
Art. 3º A autoridade administrativa decidirá sobre a representação de que trata o parágrafo 3º do art. 2º no prazo máximo de cento e vinte dias a contar de sua formalização.
Parágrafo único. Na hipótese de desconsideração, o sujeito passivo terá o prazo de trinta dias, contado da data em que for intimado da decisão, para efetuar o pagamento dos tributos e encargos moratórios.
Art. 4º A falta de pagamento dos tributos e encargos moratórios, no prazo a que se refere o parágrafo único do art. 3º, ensejará o lançamento do respectivo crédito tributário, mediante lavratura de auto de infração, com aplicação de multa de ofício.
1º O sujeito passivo será intimado do lançamento para, no prazo de trinta dias, efetuar o pagamento ou apresentar impugnação contra a exigência do crédito tributário.
2º A contestação da decisão de desconsideração dos atos ou negócios jurídicos, quando houver, integrará a impugnação do lançamento do crédito tributário.
Art. 5º Aplicam-se as normas do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, ao lançamento efetuado nos termos do art. 4o.
Art. 6º A Secretaria da Receita Federal do Brasil poderá expedir atos normativos necessários à execução do disposto nesta Lei.
Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação."

Retomo
O fiscal deixa de ser juiz. O juiz, agora, é o delegado da Receita Federal. Reparem na redação do Artigo 1º. Ele é judicioso já na sua origem: “Os atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência de fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária (...)” Entenderam? É como se alguém estivesse redigindo uma lei instruindo o procedimento de uma investigação qualquer e já tratasse o investigado como culpado. Ora, a quem cabe esse juízo definitivo, que pode simplesmente desconstituir um contrato firmado entre as partes? É claro que é à Justiça.

A única coisa sensata desse texto é chamar a vítima da Receita de “sujeito passivo”. É isto mesmo: em sentido amplo (não apenas jurídico), ativo é o estado policial. Noto que esse projeto está voltado para empresas que têm contrato, que mantêm vínculos formais, que pagam impostos. Elio Gaspari chegou a falar dia desses até em relações de escravidão para se referir aos patrões brasileiros e seus males atávicos. Por que o governo Lula não enfia no nariz nas relações trabalhistas de mais de 50% da mão-de-obra brasileira, que está na informalidade?

A resposta é simples. Porque se vai descobrir que o custo da contratação no país é proibitivo. Especialmente agora, não é?, que a economia informal ajuda a engordar o pibinho brasileiro. Imaginem se a Justiça do Trabalho ou a Receita fossem multar toda relação trabalhista informal no Brasil. Haveria fechamento em massa de empresas e, pois, desemprego em massa. Logo, o que é necessário? Uma legislação nova, que tribute menos para levar mais gente para a formalidade. E o fisco poderia até arrecadar mais, com benefícios óbvios para a Previdência. Mas é claro que isso seria sensato demais.

O PT está de olho grande, como estamos vendo, é no bolso de 3,2 milhões de pessoas jurídicas. Quer é lhes arrancar o couro, mais impostos. Vai é conseguir fechar empresas que pagam tributos, que serão empurradas para a informalidade, onde já se encontra mais da metade da mão-de-obra.

E atenção, Congresso: o projeto de lei vem redigido na forma de Lei Habilitante. Ele não disciplina nada. Já identifica o culpado no Artigo 1º e atribui a um braço do Executivo o papel de juiz. Vamos lá, senadores! Derrubem o veto de Lula ao trecho de uma lei que foi amplamente negociada no Congresso. Ou sigam o glorioso caminho dos parlamentares venezuelanos...

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Postby mends » 28 Mar 2007, 10:07

Matilde e a revolução
O Estadão traz na edição de hoje um excelente material sobre a declaração da ministra Matilde Ribeiro, aquela que acha que o racismo do negro contra o branco é coisa muito natural. Autoridades do governo ficaram constrangidas (clique aqui para ler). Em entrevista, o sociólogo Demétrio Magnolli, colunista do jornal, defende a demissão de Matilde. Estudioso que é, afirma: “O que existe é uma exclusão social e econômica dos pobres — entre os quais os de pele escura e também os de pele clara. É falso definir como problema racial o que é na verdade um problema social e econômico.” E mais adiante: “Aplicada de maneira geral, a idéia de que as pessoas se tornam mais racistas à medida que sua consciência aumenta é uma justificativa para a existência da Klu Klux Kan. Na realidade ocorre o contrário”. E há um deputado petista, Carlos Santana (PT-RJ), que apóia a ministra. E ainda lhe fornece equívocos novos.

Dia desses, não sei se vocês estão lembrados, peguei no pé de um promotor aí que queria que um novelista alterasse a seu roteiro para adaptá-lo à legislação. Na enquete, sugeri, de brincadeira, mudar a história de alguns clássicos para deixá-los ao gosto do politicamente correto. No caso de Monteiro Lobato, brinquei: Tia Nastácia empala Dona Benta e funda um quilombo com Tio Barnabé. Não acho que o meu besteirol bem-humorado esteja distante do que afirmou uma ministra de estado e do que certas lideranças negras andam dizendo por aí.

Recupero mais tarde uma pendenga em que entrei com o Ministério da Educação, ainda nos tempos de Primeira Leitura, a propósito de cotas raciais. Assim como os números gerais que justificam as políticas de cotas são todos perturbados, criando o falso mito da maioria negra do Brasil, os dados específicos sobre a quantidade de negros na universidade são igualmente distorcidos. Bem torturada, como se costuma dizer, a estatística confessa qualquer coisa. Isso poderia valer também para o meu argumento? Em tese, sim. A questão é saber se sou eu ou a ministra a incitar o ódio racial.

Deixo um pouco de lado esse tema em particular para me fixar no ambiente em que uma besteira como aquela, gravíssima, é dita sob o silêncio cúmplice do governo. A questão racial, nesse debate, é mero pretexto. O fundo que sustenta a mistificação é, evidentemente, político. A ministra da integração racial é negra, sem dúvida. Mas há uma outra condição, que só tem a ver com a sua escolha e a sua visão de mundo, que convive com essa condição herdada: ela é petista. O PT, como sabem, é aquele partido onde não há pecado nem perdão. Explico-me: o PT é aquele partido cujos militantes são sempre impolutos, pouco importa o que façam — e, pois, não pecam. E que jamais concedem aos adversários o benefício do equívoco, da dúvida ou da remissão: nesse sentido, eles também não perdoam. A menos, claro, que o vivente aceite a servidão.

É impressionante que não ocorra a dona Matilde indagar seu próprio partido e o governo que ela integra sobre a distribuição de cargos do primeiro escalão segundo a cor da pele. Talvez não haja um negro ou mestiço para a Fazenda e o Banco Central, mas não os haverá para a Saúde, Educação, Previdência, Integração Nacional, Relações Exteriores, Turismo, Planejamento?... Bem, não vou listar aqui a penca de ministérios de Lula. E, no entanto, negra mesmo só a ministra dos negros. E, a se considerar negro um mestiço, Marina Silva, que cuida, por assim dizer, dos povos da floresta. Não! Eu não quero um governo loteado segundo as cotas raciais. Eles é que querem impô-las como lei à sociedade, sem que nem mesmo se dêem o trabalho de dar o exemplo.

Porque assim é o PT. Uma ministra manda a Constituição às favas, incita o ódio e o conflito raciais, mas é incapaz de reconhecer em seu próprio ambiente o mal que denuncia no mundo exterior. Porque petistas, meus amigos, ah, petistas não são racistas jamais! A adesão ao partido os livra desse risco. Ainda que fique escancaradamente evidenciado que negros e mestiços estão sub-representados no governo Lula — entendam: o critério da representação é deles, não meu —, isso é visto como uma circunstância sem importância. Afinal, pertencer ao partido é beber permanentemente da fonte do bem. Assim, o ato racista de um petista só pode ser um problema de interpretação, de leitura. Já um não-petista tem um déficit inicial de inocência. Ainda que ele jure que a cor da pele, para ele, é irrelevante, restará a suspeita de que é um racista cordial. Se for branco, a ministra Matilde logo enxerga um chicote na sua mão.

Isso vale só para raça? É claro que não. Vejam, por exemplo, o caso do mensalão. Um relatório da PF (leia abaixo) acaba de concluir que o valerioduto desviou R$ 39 milhões do Banco do Brasil. Em benefício de quem? Meu? Seu? Dos negros “discriminados” de madame Matilde? Nada! Em benefício do PT e de um projeto de poder. Ah, mas eles ficam enfurecidos. E gritam: “Preconceito! Golpismo! Direitismo!” Pouco importa se o caso é racismo ou roubo, eles inventaram os crimes do bem, aqueles cometidos para nos salvar, as lambanças necessárias para destravar o Brasil. E proclamam: “Nada se provou contra nós”. Lula sabia do desvio? Não. Dirceu sabia? Não. Genoino sabia? Não. Além dos crimes do bem, inventaram também os crimes sem criminosos.

A declaração da ministra Matilde Ribeiro é, em si mesma, uma estupidez, um cretinismo, um embuste. Mas é mais do que isso: é um sintoma de um tempo, de um certo adoecimento institucional do Brasil, atacado pela virose petista. Olhem a trajetória deste partido: sua força está no permanente rebaixamento das instituições, que vão se tornando reféns dos caprichos do partido. No dia-a-dia, esse rebaixamento se evidencia por meio da falta de decoro, seja na relação entre Poderes, seja na noção mais comezinha de adequação — lembram-se do ponto G da Rodada Doha?

Foi-se a esperança de um Estado neutro, judicioso, decoroso enfim. O revolucionário diria: “Mas este é o Estado burguês, mascarado pela ideologia”. Digamos que fosse assim. Lula, por acaso, é revolucionário? Dou graças aos céus que não seja. O problema é que o petismo rebaixou (sempre segundo a linguagem deles) o “Estado burguês”, que mediava a “luta de classes”, a uma espécie de arranca-rabo entre corporações de ofício. Quando os petistas, ainda hoje, acusam Dona Zelite disso ou daquilo, sorrio de forma quase melancólica. Cadê Dona Zelite? Está de avental, sestrosa, cozinhando para o PT. Matilde Ribeiro é só o sintoma de uma síndrome.

Com mais de 200 anos de atraso, também estamos fazendo a nossa "revolução burguesa". Os nossos "revolucionários" também são burgueses, só que do capital alheio.
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Postby mends » 03 Apr 2007, 19:12

Direita, esquerda, loucura e método
Eu tenho, vocês sabem, uma definição do que são direita e esquerda assentada na história e, tanto quanto possível, livre, em princípio, de uma carga valorativa. Esquerdista, pra mim, é todo aquele que aceita, sob certas condições (alguns aceitam sempre), solapar a lei em nome do que entende ser justiça social. Direitista é quem não aceita esse solapamento e quer o triunfo da lei, independentemente de ela produzir mais ou menos justiça social. Reparem que estou sendo bonzinho. Não emprego o sinistro critério das mortes para julgar: extremistas de esquerda e de direita já mataram muito. A montanha de cadáveres da esquerda é bem maior sob qualquer critério que se queira. Adiante.

Os partidários da social-democracia, por exemplo, querem-se da esquerda moderada e, por isso, rejeitam o stalinismo porque ele é avesso à liberdade; os liberais, incluídos na direita, repudiam a herança fascista porque, obviamente, ele foi antiliberal. Segundo o que vai acima (a minha própria definição, pois), sou de direita. Sempre que a lei vai para o diabo em nome da justiça, estou convicto de que se produz ainda mais injustiça — que vem a ser o exato contrário do que a esquerda diz pretender. De fato, eu não acredito que possa haver progresso sem o triunfo da ordem legal. Se e quando for o caso de mudá-la, o Parlamento é o lugar para tratar do assunto. Mundo afora, acho que essa clivagem distingue, se for o caso de se eliminar a marca excessivamente ideológica das palavras “direita” e “esquerda”, “progressistas” e “conservadores”.

Mas não se distinguem só nos métodos e em como tratam a ordem legal. Esquerdistas e direitistas também têm visões opostas sobre o papel do Estado, do indivíduo, da família — alimentam, em suma, utopias e até escatologias contrastantes. Também nesse caso, creio que meu universo mental esteja mais à direita. No melhor do meu mundo, cada indivíduo se preocupa só consigo mesmo e com a sua família e responde pelos seus atos, com as regras de respeito ao outro devidamente interiorizadas, sem a necessidade de um Estado vigilante. A esquerda vê em cada indivíduo um risco e aposta que o contrato social, e só ele, é que pode regulá-lo. Nem uma nem outra viverão o melhor do mundo que imaginam. E, como disse, suas escatologias também são opostas: o fim do mundo para um direitista é o descrito por George Orwell em 1984. O do esquerdista é aquele anunciado por Francis Fukuyama em O Fim da História e o Último Homem — “Então não nos libertaremos mais?”, eles se perguntariam.

Mesmo com o Banco Central entregue aos cuidados de Henrique Meirelles, o PT continua a ser de esquerda? É claro que sim. Uma esquerda que busca o socialismo? Bem, acho que os petistas já se tornaram mais cínicos do que isso. Imaginar que o Brasil possa, estando onde está, vir a ter uma economia planificada nos moldes socialistas me parece besteira. O mercado, reparem, não dá a menor bola para esse tipo de debate. Ele não quer saber qual é a ideologia do petismo. A sua pergunta sempre será a seguinte: o modelo rende? Rende. Então tudo está no seu devido lugar.

O PT tem a sua “utopia” sem jamais deixar de ser realista. Continua de esquerda, sim, porquanto não enxerga na ordem legal, nas instituições, um limite para a sua ação. Ao contrário: ao se dizer o partido dos “movimentos sociais”, assume o ambíguo papel de quem, no poder, responde pela aplicação da lei e, fora dele, pela sua transgressão. Na realização extrema dessa ambigüidade, é petista tanto o criminoso como o seu juiz, tanto o bandido como a polícia. No confronto entre a ordem e a desordem, a soma é diferente de zero, porque é evidente que a lei está sempre alguns passos atrás dos anseios. Ela existe, aliás, para regulá-los.

Os direitistas, os conservadores, mostram-se ainda despreparados para entender esse jogo petista — e, por isso, estão comendo poeira. E talvez venham a comê-la ainda por um bom tempo. Quando Lula faz uma política econômica que, exceção feita a um detalhe ou outro, é do agrado do mercado, a crítica da "direita" ao petismo logo se deixa desvanecer pelo pragmatismo: “Afinal, ele está seguindo as regras”. Há uma enorme dificuldade de reconhecer que “seguir as regras” é uma precondição — ou condição necessária — para que todo o resto do arcabouço legal seja permanentemente confrontado pelo “ilegalismo” do que os petistas chamam “movimentos sociais” ou “sociedade organizada”. Como eles dizem, o "legítimo" vale mais do que o "legal".

Eu, um “direitista” segundo os termos aqui aplicados, vejo, por exemplo, uma lenta, mas permanente, desinstitucionalização do país. Está presente na relação entre os três Poderes, na educação, na cultura política, na confusão entre o público e o privado, no reiterado desprestígio da ordem legal, na sem-cerimônia com que o estado, por meio de seus vários agentes, dá uma solene banana para quem paga as contas da máquina: o cidadão comum. E tenho muito claro que essas coisas não são ocorrências fortuitas, não. Há um projeto de poder que as organiza. E este projeto está em curso — na verdade, já é uma realização.

Fiquemos com o caso dos controladores de vôo. Não, eu não creio, é certo, que Lula tudo fez para que a crise chegasse a esse ponto, até ser levado a desautorizar o comandante da Aeronáutica. O descalabro não resulta de uma conspiração, mas de uma consideração tipicamente da esquerda: as instituições são entraves para se chegar à solução, e não seus instrumentos — que é o que pensa a direita democrática.

Ora, ora, ora... Há, sim, esquerdistas, petistas ou não, que sabem muito bem o nome do que praticam. Se forem de cepa legítima, desprezam a democracia porque tal modelo não coexiste com a crença de que uma classe ou grupo detém a verdade histórica. A rigor, alguém que se diz esquerdista e, ao mesmo tempo, democrata só está plantando antíteses no jardim. Se realmente consciente daquilo que é, ou será uma coisa ou outra. Mas há, admito, os que confundem impulsos de generosidade, seu desejo de justiça social, com o que imaginam ser um país ou um mundo governado pela esquerda. São ingênuos a serviço de uma causa cujo alcance desconhecem.

O PT continua, sim, a ser de esquerda, em especial no entendimento que tem da política e na forma como imagina organizado o poder. Os inocentes ou muito interesseiros gostam de afirmar a existência de um Lula que contraria grandes interesses e que, por isso, é detestado pelas elites — aquela bobajada que se encontra, com freqüência, nos blogs dos anões. Alguém seria capaz de citar uma briga importante, uma que seja, que Lula tenha comprado com os “poderosos” (como eles gostam de dizer)? Vamos lá. Uma me basta. Não há. Lula é de uma subserviência exemplar.

Mas não é inocente. Não é bobo. Não é um qualquer. Sabem o que há em comum entre o mensalão e a desmoralização do comandante da Aeronáutica? A convicção plena, clara, exercida com desassombro, de que as instituições estão aí para ser superadas; de que as instituições são tabus, que devem ser quebrados; de que as instituições são vontades manifestas dos “inimigos” e precisam, pois, ser reformuladas, mudadas. É claro que Lula e o PT, ainda que fiquem cem anos no poder, não vão construir o socialismo porcaria nenhuma. Mas podem, sim, construir um modelo autoritário, para o qual a tradição esquerdista do partido é utilíssima.

Repetindo, então, o já bastante citado Polônio, de Hamlet: o que Lula fez com a Aeronáutica é, sim, uma loucura. Mas tem método.

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Postby mends » 05 Apr 2007, 15:31

A lógica dos Corleone
O Apedêutis pediu a Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, que adie o quanto puder a votação do veto à Emenda 3 (ver abaixo). O governo quer porque quer arrumar uma “alternativa”. Eu me confesso impressionado com tanto empenho. Por mais que eles estejam de olho no bolso dos contribuintes, não é tanto dinheiro assim. Então por que a determinação? Para a Nova Classe Social, a dos burgueses do capital alheio, isso é uma questão de princípio. Lembra, assim, a reação dos Corleone quando descobriam que alguém operava em sua área. A República Sindical não aceita independentes. Infelizmente, os 3,4 milhões de profissionais estão sem o amparo de lideranças graúdas da oposição.

Aos línguas de trapo que me acusam de defesa interessada da Emenda 3: podem ficar tranqüilos. Com veto ou sem veto, a questão não me diz respeito. Eu, como Lula, estou nessa batalha por princípio: ele quer alguns milhões de pessoas debaixo do chicote sindical, e eu pretendo que elas sejam livres.

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Postby mends » 09 Apr 2007, 10:18

Lula é indeciso, deslumbrado e não gosta de governar
O historiador Marco Antonio Villa, professor da Universidade Federal de São Carlos, é um caso raro no Brasil: consegue pensar mesmo estando na universidade. Há uma entrevista sua no Estadão deste sábado, concedida a Angélica Santa Cruz, que vai ao ponto.

O governo Lula tem sido identificado com a dificuldade de tomar decisões políticas e administrativas. O senhor concorda?
Lula não sabe tomar decisões, não fica confortável diante delas. É uma característica pessoal. Em 1980, por exemplo, sumiu de vista em dias decisivos da greve em São Bernardo do Campo. “Cadê o Lula?”, perguntavam todos. Estava em um sítio, perto de uma represa. Foram lá dar uma dura nele e ele reapareceu no dia seguinte, na assembléia da Vila Euclides. O jornal local estampou a manchete “Ele voltou!”. Lula tem uma dificuldade de tomar decisões que não começou na Presidência, ficou evidente em todos os momentos-chave de seu primeiro mandato e reapareceu agora, no primeiro trimestre de seu segundo governo. O apagão aéreo é apenas um exemplo de uma lista extensa.
(...)
Em momentos de crise, quando ânimos estão exaltados, não pode ser prudente do ponto de vista político adiar decisões relevantes?
A indecisão do presidente é boa para ele, mas péssima para o País. (...) Quando o caso Waldomiro Diniz estourou, ele adiou a decisão sobre o que fazer com José Dirceu, o homem que naquele governo representava quem de fato tinha pendor para as tarefas executivas. Acabou precisando tomar essa decisão mais adiante, em circunstâncias mais penosas. Demorou a decidir pela saída de Antonio Palocci - quando a quebra do sigilo bancário é um ato gravíssimo - , depois foi esvaziando o prestígio de Luiz Gushiken. Deixou a nação por dias esperando explicações sobre o mensalão e foi falar o que quis, sem contraditório, em uma entrevista em Paris. Politicamente, a indecisão pôde ser boa para ele, que foi reeleito. Mas são escolhas ruins para o Brasil, porque desmoralizam valores republicanos. No sentido mais amplo, é também uma escolha perigosa, porque tributária de uma política conservadora.
Como assim?
Apostar no esquecimento é uma característica do conservadorismo político. Nos últimos tempos as pessoas têm falado muito da frase do Ivan Lessa, que disse que a cada 15 anos o Brasil esquece de tudo o que aconteceu nos 15 anos anteriores. O governo Lula atua em uma faixa que mistura essa máxima com a lógica de Delúbio Soares, que previu que toda a denúncia do mensalão acabaria em “piada de salão” - e tinha razão.
(...)
O presidente Fernando Henrique Cardoso chegou a ser definido como um político que não sabia dizer não. Qual é a diferença entre ele e Lula nesse quesito?
Fernando Henrique também teve ampla base no Congresso, mas foi testado em outras esferas. Pegou a economia mundial em situação complicada, enfrentou problemas com as reservas. Aí tomou decisões. Lula pegou céu de brigadeiro na economia mundial e nem assim soube aproveitar o momento favorável para dar um salto em relação à situação que encontrou. Manteve a política econômica no ponto em que pegou. As crises econômicas mundiais aparecem em ciclos e os especialistas dizem que há outra em vista. Vai chegar em breve o momento em que vamos precisar de um presidente com perfil executivo, que saiba decidir. E nós não temos. Usando as analogias futebolísticas que agradam a Lula, uma coisa é ser técnico do Santos na década de 60, com aquela equipe de estrelas que se moviam sozinhas; outra é ser técnico do Corinthians hoje.
O senhor está dizendo que Lula não governa?
O presidente Lula não gosta de ser um executivo, reunir equipes, levar relatórios para casa, pegar retornos técnicos e, com base nisso, tomar decisões. Nesse sentido, ele não preside. O presidente gosta do poder, é encantado pelo cerimonial do Palácio e por tudo o que é externo ao ato de governar. Gosta de fazer discursos com temáticas pessoais, autobiográficas. Gosta do mundo palaciano em que presidentes jamais são vaiados e exerce uma “Presidência do Espetáculo” que até lembra o Absolutismo, em que tudo é revelado. Até no site da Presidência aparece sua história de sacrifícios. Mas Lula precisa se encantar também com o terceiro andar do Planalto, com a mesa de onde precisa administrar o País. Nenhum governante sobreviveu à história apenas com sua cota de carisma. Getúlio Vargas era um administrador dedicado. Criou grupos de trabalho, entendia seu governo. Em seus diários, essa rotina fica clara. Há anotações com lembretes para ler relatórios e livros que poderiam ajudá-lo a governar. Não à toa Lula se cerca de colaboradores com atribuições de primeiros-ministros, como José Dirceu, no primeiro governo, e Dilma Rousseff, agora. Presidentes que não fugiram de decisões não se cercaram de gente forte assim. A dificuldade para decidir, em um presidente, não é só curiosidade. O País precisa de administradores reais.
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Postby mends » 18 Apr 2007, 21:06

Um espectro ronda o direito: a Folha "condena" Diogo no dia 16, e o juiz só assina a sentença no dia 17
O leitor que se assina Flávio P. me manda a seguinte mensagem:

Reinaldo, mudando de leve o assunto: a condenação do Mainardi por um juiz carioca no processo movido pelo Franklin Martins foi antecipada, minuciosamente, pelo Kennedy Alencar...
Olha só que interessante: http://www.migalhas.com.br/mostra_notic ... ?cod=38040


Comento
Do que fala o leitor? O caso, com efeito, está perfeitamente reproduzido no link acima. O agora ministro Franklin Martins — encarregado justamente de lidar com a imprensa — processa Diogo Mainardi por danos morais. Acusa o colunista de lhe ter atribuído tráfico de influência na nomeação de parentes. Bem, recorrer à Justiça é direito de todo brasileiro.

O que interessa na observação do leitor é outra coisa. No dia 16 deste mês, o jornalista Kennedy Alencar, da Folha de S. Paulo, noticiou, na Folha On Line, que Franklin vencera o processo em primeira instância. Até aí, tudo certo.

Acontece que a sentença do juiz, Sergio Wajzenberg, é do dia 17. Como o repórter soube no dia 16 o que o meretíssimo só decidiria no dia seguinte é um desses mistérios que aguardam explicação. Diogo tratará desse mistério no podcast de amanhã e na sua coluna na Veja no fim de semana. Estou aqui com os dedos coçando, mas deixarei este filé para a culinária mainardiana, hehe.

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Postby mends » 22 Apr 2007, 11:47

Eles querem estado de direito ou punição de adversários?
Já mandei para o blog que os pariu centenas de comentários sobre o caso Diogo Maianrdi-Franklin Martins. A canalha é mesmo engraçada. Nem digo que é stalinista porque, a boa parte, falta cultura política até para ser assim rasteira, vulgar. Os pterodáctilos petralhas não querem nem saber: como eles não gostam do que Diogo escreve, não estão nem aí se houve ou não ilegalidade no caso — ilegalidade, que fique claro, não necessariamente na suposta antecipação de Kennedy Alencar (isso é ocorrência derivada), mas na redação de uma sentença antes mesmo da anexação da defesa. O “vazamento” é grave? Ora, dispensável dizer: pode estar caracterizada aí a mobilização de um veículo da imprensa contra os “inimigos” da hora, num caso que envolve um colunista e um ministro de Estado.

Aqui se mostra a diferença principal entre o que eu chamaria a visão liberal-democrática de mundo e a visão esquerdopata. Há dias, fiz aqui um texto distinguindo a direita democrática da esquerda, lembram-se? Disse, então, que essa direita não aceita solapar a legalidade em nome de um entendimento do que seja “justiça”. E afirmei que a esquerda aceita, sim: se ela entender que alguma coisa é “justa” segundo o seu próprio tribunal, que se dane a lei. Ora, os petralhas acham “justa” a condenação de Diogo, ainda que pese sobre ela uma grave suspeita de ilegalidade. Afinal, o que importa a lei se for para pegar um “reacionário”?

Façam um exercício simples: invertam os sinais dessa equação. No lugar de Diogo, coloquem um jornalista considerado “progressista”; no lugar de Franklin Martins, ponham um ministro do PSDB; no lugar de Kennedy Alencar, escolham um repórter considerado “reaça” (eu não, porque não sou repórter). E, se quiserem, como lembrou o próprio Diogo certa feita, leiam os textos do colunista fazendo de conta que a mulher dele é assessora de, sei lá, Jorge Bornhausen. A esta altura, o Sindicato dos Jornalistas, a ABI, a Fenaj, a CUT, o MST, a Associação dos Povos da Floresta, a Federação das Comunidades Indígenas, o Coletivo Contra o Aquecimento Global, a Associação Feminista Pela Liberdade de Escolha para Assuntos de Reprodução e o Movimento GLTB- ASDFG-HJKLC, toda essa gente já estaria fazendo abaixo-assinado e gritando contra o, como é mesmo?, “pensamento único”.

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Postby mends » 22 Apr 2007, 11:49

Greves em SP. Ubaldo, o Paranóico adverte: olhem a ditadura PT-CUT em ação
Lembram-se da Emenda 3 do lei que criou a Super-Receita? Aquela vetada por Lula, que proíbe que fiscais de Receita se comportassem como juízes?

A CUT é contra a Emenda 3 porque ela é do interesse de profissionais liberais — formais e que pagam impostos — que não querem ser escravos de sindicatos nem lhes garantir a mamata do imposto sindical.

A Força Sindical é contra pelas mesma razão e porque, hoje em dia, é empregadinha da CUT, e seus capas-pretas são empregadinhos de Lula.

O que a Emenda 3 tem a ver com os metroviários? Nada.
O que a Emenda 3 tem a ver com os motoristas de ônibus? Nada.

E, no entanto, motoristas e metroviários decidiram fazer uma greve, nesta segunda, que promete infernizar a vida de São Paulo. Uma greve contra a Emenda 3 e em defesa do veto de Lula. Isto mesmo: as centrais sindicais estão mobilizando os trabalhadores desses setores em proveito próprio e em defesa de uma decisão de seu chefe supremo. O conjunto dos paulistanos pode viver um dia de inferno porque as centrais sindicais temem que novas formas de contrato de trabalho diminuam o seu poder.

Os ônibus prometem parar das 3h30 às 6h.
Os metroviários dizem que vão começar a operar apenas às 6h30, não às 4h30.

A intenção é gerar o caos. Se a greve der certo, esses passageiros da madrugada, sem alternativa, superlotarão as estações e terminais, gerando transtornos e atrasos em cascata, que se arrastarão por horas. Trata-se de uma reivindicação que, se atendida, melhora a vida dos motoristas? Não. Trata-se de uma reivindicação que, se atendida, melhora a vida dos metroviários? Não. Trata-se de uma reivindicação que é do exclusivo interessa das centrais sindicais e, claro, do PT.

Vocês sabem. Não sou um desses jornalistas mentalmente saudáveis que conseguem interpretar a alma profunda de Lula quando ele entra em frenético diálogo com sua própria consciência ou faz comentários com interlocutores. Sou Ubaldo, o Paranóico, perseguido por sindicalistas de casaca e charuto. Na minha paranóia, eu diria que a mobilização das centrais contra a Emenda 3 é o primeiro ato do que eu chamaria de Fase Dois da República Sindical dos Burgueses Sem Capital.

Reparem que a questão é puramente política. As centrais sindicais, o PT e a Presidência da República decidiram se unir e dar uma blitz numa lei aprovada pelo Congresso. É uma espécie de ensaio do modelo ideal da República dos Companheiros: se o Parlamento não faz o que ele querem, prometem transformar a vida dos brasileiros num inferno.

Trata-se de uma chantagem. E os que estão fazendo proselitismo em favor do veto de Lula dirão que se trata de democracia. É assim que se faz a ditadura petista.

Só estou mais calmo porque Tasso Jereissati, presidente do maior partido de oposição, já subiu a rampa. Menos de 24 horas depois, Lula acusava o governo de que Tasso fez parte de ser o responsável pela violência no Brasil, numa prova evidente de que a conversa, com efeito, rendeu frutos...

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Postby mends » 22 Apr 2007, 11:52

BANDO DE VAGABUNDOS!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
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Postby mends » 03 May 2007, 17:36

Podcast do Diogo: Eros Grau, a Justiça, a luta de classes, o comunismo e idéias flatulentas
Daqui a pouco, vai ao ar o Podcast do Diogo Mainardi, cuja íntegra segue abaixo. Ao ler, tentei achar alguma graça. Não consegui. É coisa seríssima, meus caros. Um juiz da nossa Suprema Corte diz que “o direito que está aí está comprometido com a ordem burguesa”. Mais: diz ter sido comunista e emenda: “Quem foi nunca deixa de ser”. Mais ainda: diz que, em seus votos, tenta preservar a sua “utopia”. Publico o link com a locução de Diogo daqui a pouco.

Eros Grau é ministro do Supremo Tribunal Federal. Acaba de lançar um livro de poesia erótica. O título é Triângulo no Ponto. Na última quarta-feira, ele foi entrevistado por Ricardo Noblat, no Globo. Criou-se uma certa atmosfera de escândalo em torno do livro. Na verdade, escandaloso não é o livro – é a entrevista.

Eros Grau foi indicado ao STF em 2004. Sim: por Lula. Sim: Lula escolheu errado. Sim: entre escolher certo e errado, Lula sempre escolhe errado. Eros Grau ocupa o cargo mais alto da Justiça brasileira. Mas o fato é que ele não acredita na Justiça. Ou, pelo menos, não acredita naquilo que nós chamamos de Justiça.

Na entrevista para o Globo, ele diz: “O que o direito manda não coincide necessariamente com o que eu acho. O direito que está aí é mais comprometido com a preservação da ordem burguesa”. Ricardo Noblat pergunta: “A utopia se perdeu?” E Eros Grau responde: “Para mim, não. Tento preservá-la nos votos que dou. O Poder Judiciário é uma arena onde se joga a luta de classes. Sempre faço algumas coisas mostrando a minha preocupação com o social. Nossa ordem jurídica é comprometida com as relações mercantis – sobretudo com as de intercâmbio”.

Isso significa que Eros Grau está no STF para atacar a ordem burguesa, para preservar a utopia, para tomar partido na luta de classes, para favorecer as camadas mais pobres da população e para interferir nas relações mercantis. Quanto à aplicação das leis, ele afirma que as aplica, sim, mas um tantinho a contragosto, porque elas não correspondem ao seu ideal de justiça.

Noblat pergunta até quando Eros Grau foi comunista. Ele responde, com uma ponta de orgulho: “Quem foi nunca deixa de ser”. Quando ouço falar em justiça comunista, penso imediatamente em tribunais de exceção, em tróicas, em artigo 58, em expurgos, em inimigos do povo, em gulags, em execuções sumárias. Se Eros Grau fosse nazista, ele jamais admitiria isso em público. Mas o nazismo não foi pior do que o comunismo.

Não me importo que um ministro do STF escreva poesias sobre sexo anal ou sobre “sonoras flatulências vaginais”. Eu pediria mais recato e mais pudor apenas quando ele trata de Justiça.
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Postby mends » 04 May 2007, 09:16

Por um STF sem fascistas. E sem comunistas
Num tribunal literário, o romancista Eros Grau seria sentenciado à pena máxima. E ele a pagaria até o último vocábulo impróprio, até o ultimo pernosticismo, até a última tolice, até a última literatice, até a última lorota erótica, com seus “peitinhos de perdiz”, “pênis como se fosse ferro em brasa, que chega até a garganta” (???) e “flatulências vaginais” — tenho uma hipótese para essa ocorrência sonora, mas prefiro me abster. Ao estrear como autor fescenino, Eros Grau só conseguiu ser cafona, flechando o bom gosto, o bom senso e o decoro da língua.

Mas isso é problema dele. O senso de ridículo é uma das coisas mais mal-distribuídas no mundo. A melhor coisa do romance de Grau — Triângulo no Ponto — é a liberdade que temos de ignorá-lo. Em suma: não somos obrigados a lê-lo. Grau não pode nos submeter a seus juízos sobre o que é ou não é boa literatura. Mas a sua opinião sobre o direito e a Justiça, infelizmente, é problema nosso. Na entrevista concedida a Ricardo Noblat, publicada em O Globo, o juiz Eros Grau, um dos 11 membros do Supremo Tribunal Federal, foi muito além do razoável.

Também isso vamos ignorar, porque estamos nos acostumando a ignorar tudo. Poucos se dão conta do paulatino e contínuo rebaixamento das instituições brasileiras. São tantas as barbaridades do romancista Eros Grau, que elas deitam uma sombra sobre as barbaridades que diz o juiz Eros Grau. A pergunta que resta óbvia é a seguinte: dadas as suas palavras, ele tem condições de julgar com isenção? Sua opinião sobre a Justiça brasileira é depreciativa; sua conduta como juiz, ele nos diz, busca interferir na realidade com as tintas de sua utopia — comunista, ele faz questão de revelar.

Afirma o ministro: “(...) Diria que o Direito que está aí é mais comprometido com a preservação da ordem. Mais com ela do que com a própria Justiça, porque é necessário que essa ordem burguesa seja mantida." E então informa o repórter: “A palavra ‘burguesa’ remete Eros ao seu livro de ficção. Ele lê: ‘Eu digo: nós transportávamos a utopia nos nossos ombros’”. A seqüência merece ser reproduzida na íntegra:
Essa utopia se perdeu?
Para mim, não. Tento preservá-la nos votos que dou. É quando a minha mulher diz: “Mas você é terrível, você deixa sempre a sua marca”.
Qual é essa marca?
O Poder Judiciário é uma arena onde se joga a luta de classes. Por exemplo: a greve no setor privado é uma disputa de mais-valia. A greve no setor público é uma disputa de classe. Sempre faço algumas coisas mostrando a minha preocupação com o social.

As palavras de Grau não deixam margem a interpretações nem severas nem benevolentes. Valem pelo que são. Ele vê no país um regime burguês, mais preocupado com a ordem do que com a justiça, apanágio, entende-se, do comunismo, de cuja crença ele ainda não declinou. É a sua utopia. E, como juiz, ele nos adverte: “Tento preservá-la nos votos que dou.” Àquela altura da conversa, já havia passado uma informação errada aos leitores — “Lúcio de Mendonça inventou o romance realista”; é falso! No trecho acima, fica evidente que ele, embora lide com categorias marxistas como “mais valia” e “classe”, ignora absolutamente o significado das expressões. Vai além das suas sandálias, frase que quase escrevo em latim para homenagear o professor de direito da São Francisco (USP).

Vejam lá. Um juiz da nossa Suprema Corte, que nunca deixou de ser comunista, acredita que a justiça é o delta da luta de classes, que ele toma como um dado da natureza, cuja existência ele declara com a naturalidade de quem afirma: “Hoje é sexta-feira”. A luta de classes não é um evento do mundo físico, não é como a lei da gravidade. Trata-se de uma teoria, de uma escolha, com uma marca ideológica — mesmo para quem, feito Eros Grau, cultiva um marxismo chinfrim, desinformado, rombudo. O problema é que, se é assim que ele vê o mundo, as contendas que chegam às suas mãos já passaram por esse filtro. Só posso concluir que, à altura em que decide, já identificou os "oprimidos" e os "opressores" da contenda. Utopista que é, bom comunista que nunca deixou de ser, há sempre de escolher o lado do “oprimido”. Afinal, ele quer corrigir o excesso de ordem do nosso direito com um pouco de justiça, certo?

Serão os oprimidos do “comunismo” os mesmos oprimidos da ordem liberal, que é a nossa e que dá feição ao nosso direito? Acho que não são. Se não são e se Eros é ministro de um Supremo conformado segundo essa ordem, ele tem de pedir afastamento — o que seria um gesto de grandeza — ou de ser afastado. Fica difícil ao ministro negar que tenha confessado um pendor subversivo. Isto mesmo: subversão da ordem em nome do seu entendimento muito particular do que é justiça.

Vocês se lembram: há dias escrevi aqui qual é, para mim, a diferença mais importante entre esquerda e direita. A primeira, afirmei, não solapa a ordem em nome de um entendimento particular do que é justiça; a segunda, sim. Grau, sem dúvida, é um esquerdista infiltrado no STF. Não. Não estou cobrando que haja lá 11 ministros de direita. Estou cobrando que haja lá 11 ministros preocupados com o que está nos autos e na Constituição. E que entendam o direito que temos, derivado da ordem democrática, como o consenso possível numa sociedade aberta — que, Santo Deus!, não é comunista!!!

Se a Justiça é o terreno da luta de classes, suponho que o bandido da história marxista — o burguês — estará sempre em maus lençóis quando cair nas mãos de Eros Grau , ainda que esteja certo; ainda que a letra da lei acolha a sua demanda. Não! Não sou eu que estou a dizer isso; é ele. Ora, o corolário é óbvio e vem em forma de pergunta: existe estado de direito assim? Sim, é fato, pode existir um estado de direito numa ordem ditatorial. Mas é o nosso caso? Não vivemos numa democracia? Ah, pelo visto, o marxista Eros Grau — ainda que de um marxismo meio chinfrim — deve considerar, como seus pares de ideologia, que a democracia burguesa só mascara as injustiças sociais: que não passa, como queria Lênin, de uma trapaça.

Diogo lembrou bem, e eu mesmo já escrevi isso aqui algumas vezes: não suportamos os fascistas, os nazistas, a delinqüência moral e política de direita. Por que o comunismo goza dessa reputação positiva, pode ser vendido como “utopia”? Um regime que matou 40 milhões na ex-URSS, 70 milhões na China, 3 milhões no Camboja, outros milhões mundo afora em guerras civis, esse regime pode reivindicar o estatuto de coisa benigna? Um ministro que se declarasse ainda fascista — “quem foi nunca deixa de ser” — seria suportado no Supremo, ainda que não declarasse pôr um pouco de sua utopia em seus votos? E que se note: eu defenderia que esse ministro fosse impedido de integrar o Supremo. E defendo o mesmo para um comunista.

Eros Grau faz 70 anos em agosto de 2010 e será, então, obrigado a deixar o Supremo. Eu o convido a fazê-lo já, para que possa, então, exercer livremente o seu credo ideológico e seus talentos de literato.

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Postby mends » 19 May 2007, 13:00

Diogo Mainardi
Rumo ao chavismo

"O artigo 5º da Portaria 264 estabelece as bases
para a censura dos programas jornalísticos.
Trata-se do maior atentado de Lula à liberdade
de informação. Se no futuro ele quiser censurar
o Jornal Nacional ou o Fantástico, a Portaria 264
lhe dará o instrumento legal"

Acusei Lula de reintroduzir a censura prévia no Brasil. Eu sei que ninguém mais se incomoda com ele. Eu sei que o antilulismo ficou datado. Mas Lula tem um plano de longo prazo. O risco é termos de aturar o lulismo para sempre.

A censura prévia está sendo reintroduzida por meio da Portaria 264. O artigo 4° determina que os programas de TV, antes de ir ao ar, devem ser vistoriados e autorizados pelo Ministério da Justiça. Mas há algo ainda pior do que isso. Algo que espantosamente parece ter passado despercebido. O artigo 5° da mesma portaria estabelece as bases para a censura dos programas jornalísticos. Trata-se do maior atentado de Lula à liberdade de informação. Se no futuro ele quiser censurar o Jornal Nacional ou o Fantástico, a Portaria 264 lhe dará o instrumento legal.

É melhor ir aos poucos, de frase em frase, para que o AI-5 lulista fique bem caracterizado. O artigo 5° estipula que os programas jornalísticos estão isentos da classificação indicativa. As emissoras de TV não terão de pedir autorização prévia do governo para transmitir seus noticiários, contrariamente ao que acontecerá com os programas de entretenimento. Até aí tudo certo. O autoritarismo do governo só se manifesta mais adiante, no parágrafo 2°, que diz: "A não atribuição de classificação indicativa aos programas de que trata este artigo" – e, repito, o artigo 5° inclui os programas jornalísticos – "não isenta o responsável pelos abusos cometidos, cabendo ao Departamento de Justiça e Classificação encaminhar seu parecer aos órgãos competentes".

O significado desse parágrafo é claro: os telejornais estão livres da classificação indicativa, mas terão de se submeter às mesmas regras censórias dos demais programas. Como nos tempos da ditadura militar, o noticiário será fiscalizado e eventualmente punido pelo governo. Quando se trata de Lula, eu sempre penso o pior. Se os telejornais sofrerem as mesmas restrições dos outros programas, como manda o artigo 5° da Portaria 264, a criminalidade, que todas as pesquisas apontam como o maior problema do país, será devidamente acobertada. Em caso de tiroteio numa favela, o Jornal Nacional só poderá mostrar aquilo que uma criança de 6 anos está apta a ver. Lula quer que a TV apresente uma realidade edulcorada, em que a violência não apareça em toda a sua brutalidade. O ideal lulista é um noticiário infantilizado, para menores de idade. Não podendo impedir o derramamento de sangue causado pelos criminosos, Lula impedirá que a TV mostre todo esse sangue.

O diretor do Departamento de Justiça e Classificação, José Eduardo Romão, é o grande defensor da Portaria 264. Na semana passada, irritado com as emissoras de TV, ele ameaçou "mudar o nível" do ataque do governo. Declarou numa entrevista que, a partir de agora, "passará a discutir a questão das concessões de rádio e televisão". As emissoras, segundo ele, falam "como se fossem indivíduos privados titulares de direitos à liberdade de expressão, mas não o são. São titulares de concessões dadas pelo estado brasileiro". Isso mesmo: o Ministério da Justiça lulista está dizendo que a liberdade de expressão não se aplica às TVs. É um passo seguro rumo ao chavismo.
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Postby mends » 19 May 2007, 17:01

Intolerância

Militantes reagem ao debate sobre as cotas
com ameaças e apologia da violência física


Marcelo Bortoloti

O poeta alemão Heinrich Heine cunhou, no século XIX, a seguinte frase a respeito da intolerância intelectual: "Os que queimam livros acabam queimando homens". Heine alertava para a existência de um caminho natural da censura ao pensamento, que levaria à barbárie. No Brasil, há grupos tentando criar um atalho. O debate em torno da Lei de Cotas e do Estatuto da Igualdade Racial tem provocado manifestações destemperadas de integrantes do movimento negro. A simples notícia do lançamento de um livro sobre o tema, Divisões Perigosas: Políticas Raciais no Brasil Contemporâneo, publicado pela editora Civilização Brasileira, fez com que seus organizadores começassem a sofrer ameaças. A obra traz 34 artigos que, no conjunto, questionam a racialização em curso no país. Atacam principalmente a idéia de que o preconceito racial é que define as desigualdades sociais. Imediatamente surgiram, na internet, textos que falam em guerra, sugerem ações organizadas no dia do lançamento do livro e chamam de "escravos" dois dos autores, que são negros e militantes do movimento, mas têm opinião própria. "Eu estou com medo", diz a antropóloga da UFRJ Yvonne Maggie, que está entre os organizadores.

Oscar Cabral

Yvonne: "Estou com um medo que havia muito não sentia"


A discussão sobre as cotas vem gerando uma crescente exasperação. Em uma reportagem sobre o tema no jornal O Estado de S. Paulo, na semana passada, o antropólogo Júlio César de Tavares, militante do movimento negro, pregou a violência física. "Chega um momento em que o diálogo se esgota", disse. "Acho que o racista na rua tem de apanhar." Frases assim são ainda mais assustadoras quando encontram respaldo no governo. Em março deste ano, a ministra Matilde Ribeiro, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, puxou o coro da intolerância em entrevista à BBC: "Não é racismo quando um negro se insurge contra um branco", disse.
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