by mends » 24 Mar 2006, 11:22
Radicais e o MST
Josué Maranhão
BELO HORIZONTE (MG) – Há pouco menos de dois anos, quando comecei escrever neste espaço, depois de haver criticado, em uma crônica, a atuação do MST, invadindo e danificando bens de uma propriedade rural produtiva, soube de comentários em que eu era classificado como reacionário e direitista.
Procurei saber de quem teriam partido os comentários e todos tinham sido feitos por jovens, em início de carreira profissional, ou ainda estudantes, embora já na fase de cursos de pós-graduação.
Entre eles, um que me criticou com mais veemência, chamando-me de burguês reacionário direitista, era um estudante de curso de doutorado na USP, com mais de 25 anos, que nunca trabalhou e sobrevive às custas de uma bolsa de estudos de uma das entidades oficiais voltadas para a área, mas principalmente aproveita-se da gorda mesada que lhe dá o papai rico. Dizia-se esquerdista revolucionário, trotskista, contrário a todos os tipos de governo, que não fossem radicalmente comunistas.
Achei-o um tanto fora de moda, sem falar na incoerência. Desatualizado, considerando-se que o último trotskista que se ouviu falar no Brasil foi o ministro Antônio Palocci, alcunhado pelos radicais livres petistas de “agente da CIA”, vendido ao imperialismo, por conta da política econômica que adotou no governo atual.
A impropriedade do comportamento que vi decorreu do fato de saber que, com mais de 25 anos, o jovem jamais haver trabalhado, preferindo sugar uma bolsa de estudo que poderia ser destinada àqueles que de fato dela precisam, considerando-se que o papai rico pode sustentá-lo. Não consigo entender a incoerência, principalmente em se considerando que o jovem disse que o MST deveria ser mais agressivo e lutar para extinguir a propriedade privada no Brasil.
Outro crítico _este meu conhecido_ reagiu de forma estranha, quando eu lhe perguntei, depois de ouvir as suas considerações sobre os direitos dos sem-terra invadirem propriedades produtivas, se ele concordava em ceder aos sem-teto, que são milhares em São Paulo, pelo menos uma pequena parte do seu imenso apartamento, com mais de 300m2 de área. A reação foi imediata: deixou de falar comigo.
Depois de analisar os comentários, resolvi dar um tempo, antes de voltar ao tema. Mas sempre me chamou a atenção, quando estou no Brasil, ver na televisão os pronunciamentos dos líderes do MST. Um, parece-me o maior deles, quando discursa dá a impressão de raivoso, tanto pelo aspecto físico, quanto pela virulência como ataca. O outro, dizem que o mais ativo, tem “cara de boi sonso”. Fala manso, não encara, não olha ninguém olho no olho, esquivando-se.
Vendo-os, lembro-me sempre do período anterior ao golpe militar de 1º de abril de 1964. Na época, era grande a ebulição na área rural no Nordeste, notadamente na Zona da Mata, em Pernambuco. Atuava muito ativamente, e com estardalhaço, o Movimento das Ligas Camponesas.
Surgidas em Pernambuco, espalharam-se pelos Estados próximos, sob a liderança de Francisco Julião. Era um líder autêntico, calmo, sereno, comedido, de fala mansa, que mobilizava os camponeses com poucas palavras e com uma atuação discreta.
Entrevistei-o, como repórter dos Diários Associados, poucos meses antes da instalação da sanguinária ditadura militar. Falou de suas idéias e das estratégias do movimento. Eleito deputado federal, participou do célebre comício de 13 de março de 1964, no Rio de Janeiro e, no retorno a Recife, adotou o slogan difundido pela esquerda radical do Sudeste: “Reforma Agrária já, na lei ou na marra!”.
Deflagrado o movimento militar, os primeiros a sofrer o rigor das torturas nas prisões foram os humildes e semi-alfabetizados líderes camponeses. Julião conseguiu se exilar, andou por Cuba e radicou-se no México. Anos depois, ainda na época da ditadura, li uma entrevista, na qual se penitenciava e reconhecia os erros e que os líderes das Ligas Camponesas, por ele formados, haviam sido as grandes vítimas do extremismo. Admitia a radicalização extemporânea, que teria contribuído para a aglutinação dos radicais de direita, incitando os militares à derrubada do Governo do presidente João Goulart. Vieram os 20 anos de ditadura.
O resultado da pesquisa agora divulgado, comprovando a desaprovação do Movimento dos Sem Terra pela maioria da população, deveria servir de evidência quanto ao posicionamento a adotar. Sem radicalismos, lutando pela reforma agrária, através da ocupação de terras devolutas do governo (que são muitas), ou terras privadas improdutivas, certamente, excluídos os extremos, o apoio popular poderia indicar o sucesso do movimento.
Invadir terras produtivas, bancos, repartições públicas e até a sede da Justiça Federal, como se viu recentemente, pode ser o indicativo de que o pêndulo do posicionamento da nação sempre vai ser contrário às reivindicações dos sem-terra. Para agir de forma condizente, impõe-se, inicialmente, excluir os radicais incitadores da violência e do desrespeito à propriedade pública e privada.
Mais condenável, ainda, é o comportamento do movimento, quando, através de sua ala feminina, invade um laboratório de pesquisas, como ocorreu com a Aracruz Celulose, para destruir resultados de pesquisas cientificas realizadas durante mais de um quarto de século, como ocorreu recentemente.
Mais grave ainda é saber-se que aquele grupamento de mulheres vive às custas de verbas federais, entregues no meio de um liberalismo incomum, quando se sabe que têm faltado recursos até para custeio de serviços emergenciais em hospitais públicos.
"I used to be on an endless run.
Believe in miracles 'cause I'm one.
I have been blessed with the power to survive.
After all these years I'm still alive."
Joey Ramone, em uma das minhas músicas favoritas ("I Believe in Miracles")