Política e politicagem

América Latina, Brasil, governo e desgoverno
CPIs mil, eleições, fatos engraçados e outros nem tanto...

Postby mends » 02 Sep 2004, 16:45

Alguém aí leu a coluna dessa semana do Stephen Kanitz na Veja? Brilhante. Descendo a lenha nas ONGs, que pegam 55% da sua verba dos cofres públicos e deixam em sua estrutura de 70 a 85% do que pegaram; remuneram muito bem gente que tece "loas" ao trabalho voluntário; trazem pra um tipo deorganização uma lógica que NÃO DEVERIA SER A EMPREGADA - não, nem todas as organizações humanas precisam dar "rétorrno".
Tenho uma tesezinha minha que diz que o capitalismo só dá certo, só mostra todo o seu potencial, se há solidariedade entre as pessoas. Só que solidariedade e filantropia viraram palavrão. Como bem diz o Kanitz, "não dê o peixe, ensine a pescar", virou mote. Só que quem tá morrendo de câncer não quer saber de grupo de apoio, quer saber de remédio.
De mais a mais, as ONGs só sabem botar a molecada pra jogar capoeira e "fazer arte". Que porra isso vai dar? Ensinar a trabalhar, cadê?
Solidariedade não é pra sempre; solidariedade não vê a cara. Solidariedade é a maior obrigação humana com seu semelhante. É contribuir efetivamente pra que sua comunidade tenha hospital, escola, auxílio aos pobres, sem gerar distorções de paternalismos. Não é pra se encostar, é pra ser ajudado. Entidades filantrópicas conseguem entregar, a quem precisa, quase NOVENTA por cento do que arrecada, face aos menos de trinta das ONGs. Quem tem razão?
"I used to be on an endless run.
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Postby mends » 20 Sep 2004, 15:25

ELIO GASPARI

O grão-ficcionista Gushiken
O comissário Luiz Gushiken, secretário de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica, conseguiu se tornar o mais desastrado ocupante da cadeira de grão-propagandista do governo. A extensão do estrago chegou ao seu apogeu na semana passada, quando o boletim eletrônico "Em Questão" divulgou uma entrevista falsa (repetindo, falsa) do ministro da Cultura, Gilberto Gil. Não era uma entrevistinha qualquer, daquelas em que os maganos divulgam estatísticas irrelevantes. Era um destampatório. O ministro investia contra "o fascismo das grandes corporações da mídia". Gil não dissera o que o Planalto lhe atribuíra, e a Secom desculpou-se e demitiu a responsável pelo erro. O comissariado anabolizara uma entrevista, injetando-lhe frases velhas, extraídas de contextos diferentes. O ministro não chamara as grandes corporações da mídia de fascistas, mas há gente na Secom que acha assim e gostaria de vê-lo dizendo isso.
A encrencas e parolagens do comissário podem ajudar a antever o que seria o modo petista de informar, segundo os çábios de plantão.
O governo de Lula ainda não completara seis meses quando a Secom produziu o primeiro episódio de dirigismo cultural. Um aviso da Eletrobrás condicionava os patrocínios da empresa a projetos com o zelo de "atuar em sintonia com a política governamental, em especial com o Programa Fome Zero". Dirigismo dá nisso, o Fome Zero sumiu, não sintoniza coisa alguma.
Em setembro de 2003, o comissariado da Secom produziu uma revista de nome "Brasil". Nela informou ao leitores que o Conselho de Transparência Pública e Combate à Corrupção, já tinha começado a trabalhar em defesa da patuléia. Falso. O Conselho só existia no papel. O governo não nomeara os seus integrantes. Eles só foram definidos em dezembro de 2003.
O comissário Gushiken gosta de pontificar sobre a imprensa e a alma humana. Ele diz, por exemplo, que "o ensinamento baha'i aponta que "nem tudo o que um homem sabe pode ser revelado, nem tudo o que lhe é possível revelar deverá ser julgado oportuno, nem todo dizer oportuno pode ser considerado adaptável à capacidade dos que ouvem'".
Talvez ele ache que a patuléia não é capaz de entender a diferença entre um Conselho inexistente e um Conselho de verdade. Isso pode explicar o fato de a Secom ter se metido, em março passado, em outro caso de manipulação embusteira. Colocou no ar um filmete de propaganda produzido por Duda Mendonça onde se mostrava uma paisagem do vigor da agricultura familiar financiada pelo governo. Tudo falso. A fazenda mostrada era parte de um empreendimento agrícola de 1 milhão de metros quadrados. Os trabalhadores eram empregados do fazendeiro e nada tinham a ver com a agricultura familiar. O slogan dessa campanha era "o trabalho sério já começa a dar resultado".
Todas as lambanças em que Gushiken se meteu tiveram um desfecho comum: empulhavam a choldra. Convivendo com profissionais dessa qualidade, Lula está mais do que certo ao defender a criação de um Conselho para defender a qualidade do jornalismo de Pindorama.
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Postby mends » 20 Sep 2004, 15:26

+ ELIO GASPARI

O amigo do rei

O ministro da Defesa, José Viegas, vem se mostrando um zagueiro demolidor no desmanche de um ataque dos fantasmas da falecida Transbrasil contra a bolsa da Viúva. Falida e aterrada, a empresa aérea apresenta-se como dona de hangares, escritórios e balcões em todos os aeroportos do país. Suas dívidas chegam a R$ 1 bilhão, e o espeto cravado na Infraero é de R$ 6 milhões.
No dia 27 de agosto, os advogados da falecida reuniram-se com Viegas. Querem vender à empresa americana Ocean Air os espaços aeroportuários. Viegas rebarbou a proposta.
Se os interesses da Viúva forem preservados, a Infraero assume os hangares e balcões da Transbrasil. Por decisão da Justiça, poderia fazê-lo desde o dia 5 de maio passado.
Na defesa dos interesses da Transbrasil e do seu ex-presidente Antonio Celso Cipriani está o advogado Roberto Teixeira, irmão de fé de Lula desde os anos 80, padrinho de um de seus filhos e hospedeiro do casal Da Silva entre 1989 e 1998. Em junho, Lula desceu de helicóptero no sítio de Teixeira no interior paulista para assistir ao casamento da filha do doutor.
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Postby mends » 20 Sep 2004, 15:27

gaspari

Miséria elegante

Um curioso assustou-se com a estrutura usada pelo ministro Patrus Ananias, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Ele dispõe de um autointitulado "serviço do cerimonial".
Quando o Brasil tinha metade dos pobres que tem hoje, só o presidente da República e o Itamaraty tinham esse tipo de despesa.
Ananias usufrui do cerimonial da fome.
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Postby mends » 22 Sep 2004, 09:20

ELIO GASPARI

Ave Lula, Ave grevistas
O melhor programa social do governo de Lula está em curso neste magnífico ano de 2004, aquele em que os trabalhadores saíram da pasmaceira em que foram atirados em 1995. Trabalhador não quer cartão, quer salário. Esse sentimento já levou mais de 1 milhão de brasileiros a disputar com os patrões os reajustes de seus contracheques. São bancários, metalúrgicos, petroleiros e dezenas de outras categorias organizadas cujos orçamentos a ekipekonômica mordeu e a banca comeu. Buscam uma parte do que lhes foi tungado.
Pedem reajustes salariais com a inflação (cerca de 7%) somada a um aumento real (coisa de 3% a 5%). São brasileiros que ganham, grosseiramente, entre R$ 1.500 e R$ 3.000. Ao seu lado não há economistas-de-consultoria nem plenipotenciários do Banco Mundial ou do FMI. É gente que descende da choldra parisiense que se reunia na place de Grève durante a Idade Média. Uma escumalha que nada tem a botar no pano verde senão o suor de seu rosto. Gente como o baiano Gilson Menezes, que às 7h do dia 12 de maio de 1978 entrou na oficina da Scania, em São Bernardo, e parou a fábrica, mostrando ao Brasil que os trabalhadores podiam. Estarreceu os sábios, estonteou a ditadura. Meses depois, em comandita com o Dops, a firma infiltraria olheiros nas assembléias. Não adiantou nada. Os metalúrgicos e Gilson Menezes puderam tanto que o presidente do Sindicato de São Bernardo é o atual presidente da República.
As greves e as reivindicações dos trabalhadores são o reverso do Brasil que entra na fila para ganhar o Bolsa-Caraminguá. Não fazem parte do Brasil da solidariedade com a miséria, no qual o ministro de combate à fome, visconde Patrus Ananias (Desenvolvimento Social), tem um funcionário (DAS 3) encarregado de seu cerimonial. São o Brasil que não vive dos juros do doutor Henrique Meirelles, não opera na CC5 nem está no "mensalão", mas produz o superávit comercial de US$ 30 bilhões.
Os trabalhadores das montadoras do ABC, do Paraná e da Bahia já buscaram o seu. Os bancários mandaram ao lixo uma proposta patronal aceita pela confederação dos empregados, filiada à CUT. Como diria Lula, o brasileiro não desiste nunca. Iansã e Santa Bárbara quiseram que isso acontecesse num governo em que três ex-presidentes de sindicatos de bancários são chamados de Vossa Excelência em Brasília (Luiz Gushiken, Ricardo Berzoini e Olívio Dutra).
A mobilização dos trabalhadores não é incentivada por Lula, mas é uma esplêndida conseqüência de sua presença no Planalto. Em quase dois anos de governo ele importou um avião de potentado árabe e entrou no Copacabana Palace pela porta dos fundos, mas nunca deu ao empresariado um só sinal de que estaria ao seu lado contra a patuléia. Faz quase dez anos que os tucanos esmigalharam uma greve de petroleiros que obrigava o trabalhador a carregar nas costas os botijões de gás de cozinha.
As filas dos caixas eletrônicos e das casas lotéricas foram criação da banca que não pagou salários decentes aos seus empregados. Antes de praguejar contra o trabalhador da iniciativa privada parado, vale a pena pensar no empregador que adoraria transformar um desconforto momentâneo numa satanização do grevista. É preferível gramar a fila do caixa do que cevar um condomínio financeiro que mantém quase 3 milhões de trabalhadores nas filas do desemprego.
Greve é um momento perigoso e sublime na vida do trabalhador. Não é um jogo de ganha-ganha. Há categorias que têm força para derrotar os patrões e há categorias que não a têm. Quem não a tem, como os petroleiros de 1995, arrosta o fracasso. É o jogo jogado.
O que o governo de Lula oferece ao país é um clima de ordem, progresso e decência no qual as reivindicações dos trabalhadores e mesmo suas greves são parte da paisagem, como seu Ômega australiano. O Bolsa-Dissídio é o melhor dos programas sociais, pois dá ao cidadão a capacidade de lutar pelo valor do seu trabalho, em vez de remunerá-lo pelo tamanho de sua miséria.
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Postby mends » 06 Oct 2004, 12:47

ELIO GASPARI

No segundo turno, o eleitor virou gado
Os dirigentes políticos nacionais tiveram uma recaída de coronelismo abusivo. Deveriam se aconselhar com o coronel Justino (Mauro Mendonça) de Cabocla. Em quase todas as cidades onde haverá segundo turno, os maganos anunciam que buscarão o apoio deste ou daquele candidato derrotado. Fazem isso como se a coisa funcionasse assim: os coronéis vencidos apóiam os candidatos vencedores, e a choldra faz o que seu mestre mandar.
Um cidadão pode muito bem ter votado, por convicção, num candidato derrotado, sabendo que seria batido. Ele não perdeu a eleição, como os palmeirenses perderam para o São Paulo. Há mais nobreza em perder o primeiro turno de cabeça erguida do que em ganhar o segundo de nariz tapado.
Os coronéis tratam a política como se apoios, alianças e negociações fossem modalidades de cambalacho. Problema deles. Felizmente, a patuléia não é boba.
Para ilustrar a mediocridade dos personagens que emergiram com os acordos de gado eleitoral, vale a pena revisitar uma história meio velha. A comparação é exagerada, mas a beleza do exemplo permite a licença.
Em maio de 1940, Winston Churchill acabara de assumir o cargo de primeiro-ministro. A força expedicionária inglesa (250 mil homens) estava encurralada em Dunquerque. Os alemães avançavam sobre a França, e o chefe do Estado-Maior inglês afirmava: "Este é o fim do Império Britânico". Nesses dias dois geniais pesquisadores, Charles Madge e Tom Harrison, trabalhavam no precursor das pesquisas de grupo, um programa chamado Mass Observation, M-O para os íntimos. No dia 19, antes da hora em que Churchill falou pela primeira vez ao seu povo, eles registraram que se falava em "vitória alemã". Cinco dias depois, um olheiro do M-O registrou o comportamento de algumas mulheres: "Chegaram ao ponto de declarar que dariam boas-vindas a Hitler. [...] Pelo menos teriam seus maridos de volta". Para quem gosta de pesquisas com percentagens, no dia 25 de maio o M-O informou:
Homens (%) e mulheres (%)
Alarmismo 27 e 31
Otimismo 30 e 18
Dúvida ("não sei") 21 e 30
Virginia Woolf escrevia em seu Diário: "Os alemães parecem jovens, saudáveis, inventivos. Nós vamos nos arrastando atrás deles". Sua namorada, Vita Sackville-West, e o marido, Harold Nicolson, combinaram matar-se se a ilha fosse invadida.
Nesse cenário de real valor, surgiu a possibilidade de um entendimento com Hitler, por intermédio de Mussolini. Era patrocinada por Lord Halifax, um leal servidor do Estado inglês. Seria um grande acordo de segundo turno. Na política da marquetagem, Churchill seria considerado um maluco que falava em "sangue, suor, lágrimas e trabalho duro".
Pois o maluco chutou o balde. Fez isso nas reuniões secretas do Gabinete, sem que o mundo soubesse o que acontecia. Recusou a proposta italiana, chamou Halifax para uma conversa no jardim (a respeito da qual nada se sabe), manteve a Grã-Bretanha na guerra, tomou um uísque com soda e foi dormir. Esse homem, nesses dias, salvou a civilização ocidental, amparado apenas na idéia do que achava certo. Sem pesquisas, malandragens, acordos.
<span style='color:blue'>Os sucessores do coronel Justino podem ficar dizendo bobagens, mas quem for a uma livraria em busca de "Cinco Dias em Londres", do historiador John Lukacs, poderá se livrar deles, substituindo-os por uma grande leitura no feriadão do segundo turno. Se for o caso, vinga-se de quem pensa que a choldra é idiota.</span>

**o livro destacado faz parte do meu acervo, jah li e eh muito bom. Quem quiser emprestado, eh soh pedir.
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Postby mends » 07 Oct 2004, 19:25

GIBA UM

Nem quer mais apito
Com direito a 15% do território brasileiro, o índio nacional nem quer mais apito, como dizia a antiga marchinha carnavalesca. O Brasil tem 220 povos indígenas reunidos em apenas 410 mil pessoas. Têm direito a organização social diferente do restante do país, costumes, línguas, crenças e tradições. Ou seja: é um outro país que pertence só a eles. Não pertence à União, nem ao governo e tampouco ao Brasil. O país tem 8,5 milhões de quilômetros quadrados e agora, o Governo acaba de declarar que 460 mil hectares do Norte e Nordeste serão reservas indígenas, alcançando 12,5% do território brasileiro. No final da demarcação, com mais 40 reservas, chegarão aos 15% do chão nacional. Os restantes 180 milhões de brasileiros devem se contentar com os 85% da diferença. Até o advogado, escritor, ensaísta e jurista Ives Gandra da Silva Martins andou confessando, em artigo, que “gostaria de ser índio”. Mais: novas regiões demarcadas do Norte - e pouca gente sabe disso - por ação (e invasão) e inúmeras e poderosas empresas americanas e inglesas, os indígenas não falam português. Além da língua nativa, acabam se expressando muito bem em inglês. Se o presidente Lula for lá, acabará necessitando de um tradutor.
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Postby mends » 13 Oct 2004, 10:31

ELIO GASPARI

Ao andar de cima, anistia. Ao de baixo, camisinha
O prefeito Cesar Maia conseguiu duas manchetes sucessivas de "O Globo". Na primeira, revelou que as comunidades pobres da cidade continuariam se expandindo:
"O grande problema do crescimento das favelas, a partir dos anos 80, é a taxa de fertilidade da favela, superior à da não-favela".
No dia seguinte, informou que encaminhará aos vereadores um projeto de lei que regularizará as expansões feitas nas coberturas dos edifícios da cidade.
O grande problema do crescimento das favelas não são as crianças pobres. São os prefeitos, ministros e presidentes de Pindorama. Quando Cesar Maia diz que o aumento do número de crianças nascidas em favelas gera mais comunidades pobres, enuncia uma verdade estatística e um engano histórico. De fato, o crescimento demográfico das favelas é quatro vezes superior ao da cidade. Metade desse inchaço viria da reprodução dos pobres. Muita gente boa acredita que o elevado número de crianças nascidas no Nordeste é uma das causas da miséria nacional. Dona Lindu, a mãe de Lula, teve sete filhos. Todos contribuíram para o progresso de Pindorama, ora como operários, ora como diaristas.
No espaço de uma geração, de 1970 a 2003, a taxa de fertilidade nacional caiu de 5,7 filhos para 2,2. De acordo com a teoria herodiana do aumento da renda pela redução do número de capitas, a isso deveria ter correspondido alguma melhora na distribuição da riqueza nacional. O índice de Gini, termômetro da desigualdade social, estava em 0,59 em 1970. Está em 0,55. O Brasil ficou com uma taxa de fertilidade semelhante à americana e manteve uma distribuição da renda pior que a de Zâmbia.
A segunda observação de Cesar Maia dá uma pista para se entender algumas das causas desse pastelão. Ele promete regularizar as edificações das coberturas, retirando-lhes o estigma da ilegalidade. Isso lhes elevará o valor em algo entre 10% e 20%. Aos puxados do andar de cima, racionalidade, anistia e votos de bem-estar. Às casas do andar de baixo, construídas em terrenos sem titulação, descaso e votos de abstinência, camisinha ou laqueadura.
Salvo algumas iniciativas bem-sucedidas em São Paulo e em Salvador, apesar das promessas (inclusive de Lula), poucos são os governos que conseguem fazer alguma coisa para legalizar a posse dos imóveis nas comunidades pobres. Uma pesquisa do Instituto Futuro Brasil mostrou que oito em cada dez favelados paulistas moram em casa própria, mas só 14% deles conseguem legalizar suas propriedades. O economista peruano Hernando de Soto escreveu um magnífico livro sobre a esterilidade do ervanário dos pobres. ("O Mistério do Capital - Por que o Capitalismo Deu Certo no Ocidente e Fracassa nos Outros Lugares"). Mostrou que o andar de baixo do Terceiro Mundo e do falecido bloco comunista está montado num patrimônio de US$ 9,3 trilhões condenados à informalidade. Isso equivale ao valor de todas as companhias listadas nas bolsas dos 20 países mais desenvolvidos. Na conta de De Soto estão os imóveis e os pequenos negócios. Pode-se supor que as casas da patuléia representam mais de US$ 5 trilhões. Chutando, é possível que o andar de baixo de Pindorama esteja montado em algo como US$ 20 bilhões.
O problema das cidades brasileiras não é a pobreza. É a maneira como o andar de cima (e seus governantes) olham e julgam o de baixo. Há cerca de um século, Jorge Americano, jurisconsulto e memorialista paulistano, ouviu dois maganos discutindo a crise do café e guardou a lembrança do que diziam:
"Virão então os planos de salvação, como o de Domingos Jaguaribe, que aconselhou criar macacos amestrados para colher café sem pagar salário. Bastaria um bananal ao lado do cafezal e o próprio macaco se incumbia de colher também o alimento".
Serviço: o delicioso "São Paulo Naquele Tempo (1895-1915)", de Jorge Americano, está nas livrarias. Conta como, em 1912, os paulistas fantasiados de ingleses faziam a caça à raposa, sem raposa.
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Postby mends » 18 Oct 2004, 09:33

ELIO GASPARI

"Defender o mercado" significa "tungar a choldra"
Toda vez que um empresário ou burocrata diz que uma providência é necessária para preservar investimentos ou por motivos estratégicos, a patuléia pode ter certeza: lá vem facada.
Há dois grupos de preservadores por aí. O primeiro está no setor aéreo. Como até as pedras sabem, duas empresas estão com um pé na cova. A Varig e a Vasp devem cerca de R$ 8,5 bilhões. A TAM, se for deixada em paz, vive. Desde o final do governo FFHH, tenta-se uma operação de resgate da Varig, levando-a para o ho$pital do BNDES.
A partir de 2001 começou a operar a Gol. Voa na hora, cobra barato, não pega dinheiro do governo e dá lucro (R$ 113 milhões em 2003). É considerada uma das empresas aéreas com melhor rentabilidade no mundo. Os aerotecas civis e militares tratam-na como um estorvo.
Num país capitalista, quebrariam as empresas quebradas e sobreviveriam as empresas lucrativas. Tenta-se fazer o contrário. Costura-se no eixo Ministério da Defesa-BNDES um plano de reorganização do setor aéreo, suspendendo-se por dois anos a vigência da legislação contra a formação de cartéis. Ou seja, para salvar empresas quebradas vai-se enfiar a Gol (se ela quiser) num panelão de privilégios essencialmente destinado a lesar a escumalha. Caso raro de colocação da maçã boa na barrica das podres.
O segundo grupo de conservacionistas está no setor de comunicações. Diante da intenção da Anatel de abrir a discussão para a entrada no Brasil de uma nova geração de celulares, o tabelionato chiou:
Francisco Padinha (Vivo) disse que a chegada ao Brasil da nova tecnologia "pode ser prejudicial ao desenvolvimento harmonioso do mercado".
Luis Eduardo Falco (Oi): "É preciso que haja retorno sobre o capital investido".
É provável que a nova geração de celulares seja uma solução em busca de um problema. Na Alemanha, virou mico. A argumentação dos doutores, contudo, é falsa como uma nota de três reais. Quem se harmoniza é acordeão. Mercado compete. Capital investido não é cachorro de estimação, que tem retorno prometido.
Quando se pensa que o governo está aí para vigiar esse olho gordo no bolso da choldra, dá-se que o repórter B. Piropo, numa palestra, condenou as restrições existentes à expansão do sistema de telefonia por meio da internet. Essa nova tecnologia assegura uma brutal redução tarifária. Ouviu o seguinte do representante da Anatel justificando a conduta da agência:
"Isso rouba mercado das operadoras e faz parte da missão da Anatel proteger os altos investimentos que elas fizeram no setor".
Aos contribuintes, uma banana. Na hora de cobrar tarifas aéreas caras, trata-se de preservar objetivos estratégicos do desenvolvimento nacional. Na hora da patuléia pagar menos por ligações telefônicas, fala-se em "roubar" mercado. A escumalha só pode entrar no filme no papel de roubada.
O encarregado de preservar investimentos de empresários é o Padre Eterno. Suas casas, espalhadas por todas as cidades do país, são de livre acesso, com bancadas para genuflexões e silêncio para preces. A grande exceção fica ao lado do convento de Santo Antônio, no Rio. Lá funciona a Igreja de Nossa Mãe do BNDES, gerida pela Irmandade do Espírito Santo do Planalto.
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Postby mends » 18 Oct 2004, 09:36

ELIO GASPARI

Eremildo, o idiota, acredita em rankings

Eremildo é um idiota e acredita em todos os rankings que lê. Aprendeu na semana passada que a competitividade brasileira caiu. O país saiu do 54º lugar para o 57º numa lista onde o Botsuana fica em 45º lugar, duas posições acima da Itália. Palavra do World Economic Forum, aquela agência que organiza o pacote Disney-para-Bilionários em Davos, na Suíça.
Interessado em conhecer o renascimento da antiga Bechuanalandia, o idiota cancelou suas férias em Florença e comprou um pacote para Gaborone. Mesmo sendo um cretino, ele sabe que a Aids tornou negativa a taxa de crescimento demográfico do capitalismo local. Com 30% da população adulta infectada, o Botsuana é o segundo colocado no ranking do HIV. O idiota suspeita que o modelo do Botsuana tenha influenciado o prefeito Cesar Maia quando disse que o crescimento das favelas do Rio se deve à alta fertilidade das mulheres das comunidades pobres.
Outro ranking, de fevereiro, informou que num grupo de 41 países, a capacidade de empreendimento da sociedade brasileira perdeu para a de Uganda, que ficou entre as melhores do mundo. Coisa de gente fina, com o co-patrocínio da London Business School.
O idiota passou um mês em Kampala, conhecendo o empreendedorismo local. Soube que os tempos do general Idi Amin (300 mil mortos) e do civil Milton Obote (100 mil mortos) ficaram para trás. Desde 1987, o progresso de Uganda é prejudicado pela ação do Exército da Resistência de Senhor, uma espécie de Khmer Vermelho cristão e negro. Essa organização é acusada de ter recrutado a força alguns milhares de crianças. Os meninos viraram soldados, as meninas, criadas ou escravas sexuais. Essa tropa luta contra as Forças de Defesa do Povo de Uganda, que por sua vez também seqüestram crianças e operam nos moldes de um esquadrão da morte.
Eremildo planeja organizar um grupo de $ábio$ patrocinadores de listas para uma grande excursão ao Botsuana e a Uganda. Oferecerá lugares gratuitos aos nativos do Brasil que acreditam em rankings, sobretudo aqueles que desqualificam o país onde vivem.
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Postby Wagner » 18 Oct 2004, 16:43

Só um comnetário quanto a coluna acima: EXCELENTE! :cool:
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Postby mends » 20 Oct 2004, 10:17

ELIO GASPARI

Na mágica de Palocci, ele come o coelho
A assessoria do senador Tasso Jereissati produziu um documento de seis páginas no qual pode-se encontrar um sério desafio às empulhações da ekipekonômica: o superávit primário de 4,37% do PIB (R$ 39 bilhões) obtido no ano passado foi produto de dois truques contábeis. O propalado aumento da meta de 3,75% do PIB para 4,25%, coisa de R$ 8 bilhões, simplesmente não aconteceu. Quando muito, em termos de abatimento da dívida pública, ele chegou a R$ 1 bilhão.
A primeira mágica é velha. Trata-se de não pagar as contas de um ano, jogando-as para o exercício seguinte. Uma espécie de pré-datado com PhD de Princeton. Em 2002, último ano da ruína tucana, os restos a pagar (inexoráveis, adjetivados como "processados") ficaram em R$ 3,6 bilhões. Em 2003, a ekipe companheira subiu esse valor para R$ 8 bilhões. A diferença de R$ 4,4 bilhões equivale a 0,3% do PIB.
Quando o doutor Antonio Palocci anunciou, em setembro, que aumentaria o esforço do superávit fiscal de 2003 em 0,5%, levando-o para 4,25% do PIB, esqueceu-se de contar que mais da metade desse esforço seria gasta na compra de um coelho novo para suas mágicas. O bicho deverá se chamar "aumento da dívida líquida do setor público". Pode-se dizer que a ekipekonômica fazia essa mágica ao tempo de FFHH, mas, enquanto os tucanos usaram uma só lebre (0,11% do PIB em 2001), os companheiros tiraram três gatos da cartola (0,3% em 2003).
O segundo truque consistiu em não gastar receitas constitucionalmente vinculadas, quase sempre a atividades sociais. Por exemplo: tungam-se R$ 200 milhões da saúde. Como o ervanário não pode ser gasto em outra coisa, ele vai para uma conta onde rende uns R$ 30 milhões de juros ao ano. O dinheiro fica congelado, até que o usem para a finalidade constitucional a que se destinava. Ou seja, não serve para o abatimento da dívida, objetivo essencial de toda a lenda do superávit primário. Em 2003, a ekipekonômica congelou 17% das receitas vinculadas. Neste ano, congelará 24%.
O enxugamento de R$ 8 bilhões adicionais conseguido pelos çábios foi lorota. R$ 2,6 bilhões vieram da estocagem de receitas vinculadas. Outros R$ 4,4 bilhões vieram do inchaço dos restos a pagar. Ou seja, descontados os coelhos, gatos e lebres, o superávit adicional foi de R$ 1 bilhão.
Se a moçada do doutor Palocci fez o FMI de bobo e a banca de trouxa, tudo bem. (Ou o FMI e a banca, fingindo-se de bobos, fazem de trouxas os nativos, como aconteceu com a patuléia argentina em 2001.) São truques que servirão, quando muito, para estarrecer as visitações do Fundo.
Todos os números do estudo dos assessores de Jereissati foram obtidos nas páginas do Tesouro Nacional na internet. A nota ficou pronta no final de setembro e circulou com relativa timidez. Há uns dez dias, o comissário Joaquim Levy, da Secretaria do Tesouro, soube do papel. No seu mais absoluto direito, encomendou uma réplica. Por enquanto, ela está na rubrica "contestações a pagar". Outra cópia teria chegado ao ministro do Planejamento, Guido Mantega.
O mundo das estatísticas oficiais é tão maledicente que corre um boato em Brasília: um çábio teria determinado a abertura de sindicância para apurar como esse papel foi produzido.
É o modo petista de acertar contas
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Postby mends » 25 Oct 2004, 09:05

ELIO GASPARI

As empresas tomam carteiradas amplas e irrestritas
É dura a vida do empresariado. Aguenta uma carga tributária de 40% e ainda fica sujeito a um regime de doces e transparentes carteiradas. Aqui vão dois casos acontecidos com o mesmo empresário, num espaço de duas semanas:
A agenda da casa de Joaquim Nabuco
Chegou à mesa do infelicitado homem de negócios um fax de um senhor Francisco Torres, representante da empresa Research & Communications, de Nova York, "continuando nossa conversa ao telefone". Noves fora o fato de nunca terem falado ao telefone, Torres informou-o de que a embaixada brasileira em Washington lançará uma agenda de mesa para o ano de 2005. Coisa destinada a "facilitar a comunicação e as relações públicas". O mimo será distribuído pela embaixada às "mais importantes autoridades relacionadas com a política e a economia" dos dois países.
Anexo ao fax do doutor Torres, atestando-lhe a qualificação, vem uma carta, em inglês, em papel timbrado da Brazilian Embassy, na qual o conselheiro João Pedro Costa (que o empresário nunca viu mais gordo) reitera a informação e mostra a caneta: "Nós ficaríamos felizes se o senhor pudesse contribuir para o sucesso desse projeto, recebendo um representante da Research & Communications". Anexo às duas cartinhas vem uma tabela de preços de publicidade: a página dupla da agenda custa US$ 21,5 mil, meia página sai por US$ 7.900.
O empresário safou-se da proposta. Sofreu vendo a embaixada em Washington (que sustenta com seus impostos) servindo de alavanca para uma empresa com sede em Nova York arrecadar dinheiro no Brasil. Uma repartição que já foi chefiada por Joaquim Nabuco dando-se a serviços de papelaria natalina.
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Postby mends » 26 Oct 2004, 07:41

GIBA UM

Sábado quente
Sábado, na rua Dinamarca, o advogado Geraldo Forbes, que mora em frente à casa de Marta Suplicy e Luis Favre, colocou em sua porta uma grande faixa, onde se lia: "Contra a prepotência e corrupção do PT, pela República e pela democracia, voto em José Serra". Favre não se conteve, atravessou a rua e foi tomar satisfações e quase tudo vira telecatch . Hora depois, os seguranças de Marta foram lá, e arrancaram a faixa, meio no muque.

** a faixa não mentiu...
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Postby Aldo » 26 Oct 2004, 10:40

nem os seguranças
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